Através de uma campanha de crowdfunding, maneira cada vez mais comum de arranjar meios para a produção de um jogo, a TicToc Games trouxe-nos Adventures of Pip, um jogo de plataformas de duas dimensões com uma premissa original, disponível no Steam, PlayStation Network da PlayStation 4 e Nintendo eShop da Wii U.
Tal como muitos jogos indie atuais, Adventures of Pip apresenta o que se designa por pixel-art, uma forma de arte presente em praticamente todos os videojogos mais antigos e que consiste na organização de pixéis para a formação de cenários e personagens. No entanto, o jogo da TicToc Games não se fica pelo simples retorno ao estilo retro – como se sucede na maior parte dos jogos independentes – e faz dos pixéis o seu ponto principal.
No reino de Adventures of Pip encontramos personagens de várias resoluções, existindo habitantes em 1-bit, 8-bits e 32-bits, sendo a riqueza e o estatuto de cada um diretamente proporcional ao número de pixéis que o compõe. Assim, os camponeses e aldeões mais pobres têm um aspeto mais simples com caras sem olhos e vestidos pouco detalhados enquanto que a família real e os seus pajens apresentam um aspeto refinado com vestidos e pormenores corporais muito mais ricos. De facto, muitas das falas, piadas e momentos engraçados são proporcionados pelo facto de certos personagens ficarem, por exemplo, ofendidos por tratarem assim uma pessoa da sua definição.
Neste reino, que cabe na palma de uma mão, conta-se que existiu uma feiticeira que impediu a sua destruição, utilizando o poder de uma energia vital presente ao redor de todos e por todo o reino – a Bitstream – que lhe permitia criar pixéis do nada. Muitos anos mais tarde, e sem qualquer explicação, a princesa nasceu com este mesmo poder, o que, por um lado, trouxe grande euforia, tais os feitos que poderiam ser realizados com este poder, mas, por outro, trouxe grande medo e perigo, uma vez que a Queen DeRezzia – a antagonista desta aventura – se quer apoderar deste poder para os seus próprios objetivos.
Nos momentos iniciais – que correspondem ao dia do 16º aniversário da princesa – esta vilã desloca-se até ao castelo e consegue raptar a princesa, usando o seu poder para transformar os reis nas suas versões de apenas 1-bit. Para salvar o dia, um herói invulgar e que nasceu com apenas 1-bit – Pip – parte para a sala do trono e, após testemunhar o destino dos reis, começa a perseguir a rainha de maneira a resgatar a princesa.
Tal como podem constatar, o enredo de Adventures of Pip não é muito complexo nem original, nem nunca foi essa a intenção da TicToc Games que sempre afirmou ter como intenção criar um jogo nos moldes de Super Mario. Exatamente como acontece na série de plataformas mundialmente conhecida da Nintendo, neste jogo o herói percorre vários mundos, cada um deles com um tema diferente e um boss no final.
Cada mundo de jogo é único, em termos de cenários, dos restantes, existindo ainda uma música de fundo perfeitamente adequada ao ambiente e à ação, criando momentos agradáveis em que somos levados pelo ritmo da música e o próprio aspeto interessante do jogo. Há, no entanto, um problema que se faz notar após se passar muito tempo num determinado mundo: a música é sempre a mesma. Isso mesmo, embora o jogo consiga envolver por esta comunhão entre o que ouvimos e vemos, enquanto controlamos a ação, esta repetitividade da banda sonora acaba por saturar.
À medida que vamos progredindo, vamos descobrindo um poder especial em Pip e que ajuda a tornar o jogo mais complexo, divertido e desafiante. Após encontrar um espírito protetor, Pip fica a saber que existem inimigos brilhantes que possuem a energia da Bitstream e que, ao matá-los (saltando em cima delas), lhe permitem evoluir para a sua forma de maior resolução, de 8-bits. Mais tarde, é ainda apresentada, de modo similar, uma nova forma de Pip, a de 32-bits.
Cada evolução de Pip é única e irá ser necessária para ultrapassar desafios específicos nos vários níveis. Assim a evolução de Pip com mais pixéis não é mais forte ou mais fraca que a de apenas um pixel, apenas tem atributos diferentes. Enquanto que com apenas 1 pixel, o herói consegue passar em sítios estreitos, saltar mais alto e planar durante algum tempo, na forma de 8-bits consegue dar murros e pontapés (o que serve para quebrar algumas barreiras) e saltar de parede em parede e na de 32-bits temos uma espada que nos permite atacar um maior leque de inimigos e temos mais força, o que nos permite empurrar blocos, mas, por outro lado, os movimentos são mais lentos e os saltos são mais curtos.
Devido a esta complementaridade de capacidades, até nos últimos níveis do jogo se encontram segmentos em que é necessária a utilização da forma mais simples de Pip – um quadrado. A qualquer momento, ao ser premido um botão, se pode regredir e passar para uma forma mais simples, ocorrendo sempre uma grande libertação de energia da Bitstream, que poderá servir para destruir inimigos e blocos no caminho. Aproveitando este mecanismo de evoluir e regredir entre formas pode acontecer ter-se que saltar, derrotar um inimigo, evoluir e, logo de seguida regredir, no ar, para destruir blocos que nos bloqueiam a passagem.
Esta mecânica funciona bem ao longo de todo o jogo e é, no geral, divertida e não muito complexa. Perde apenas alguns pontos pelo facto de que existem certos problemas técnicos, como ligeiras quebras no rácio de fotogramas por segundo ou ligeiras paragens de jogo durante a troca de ecrã.
Outro ponto em que Adventures of Pip falha, e que é o seu ponto mais negativo, é a falta de checkpoints. Não é que o jogo seja demasiado difícil, pois não o é (embora seja desafiante), o problema é que existem tão poucos checkpoints que a experiência pode se pode tornar, em fases mais complicadas, muito frustrante. É que mesmo a colocação destes pontos de controlo está errada, sendo que em partes mais desafiantes podemos não encontrar nenhum e depois encontrar dois relativamente perto em segmentos mais fáceis e que nem precisavam. Considero este um grave erro de design e que acaba por estragar a imersão tão bem conseguida pelos cenários e banda sonora dos vários mundos.
Esta falha acaba por ser tão notória que dei por mim a desistir de tentar encontrar todos os aldeões espalhados pelos níveis (e que constituem um desafio extra ao jogador e o obriga a explorar o nível), apenas pelo facto de poder morrer e ter de voltar muito atrás. Por isso mesmo ignorei completamente, nos níveis mais avançados, estes extras, mesmo que tenham sido muito bem incluídos e alarguem consideravelmente o número de horas de jogo.
Opinião final:
Adventures of Pip, primeiro projeto da TicToc Games, é um jogo bastante divertido e desafiante e com uma premissa muito bem concebida e original, apresentando vários diálogos engraçados ao longo de todo o jogo, protagonizado por personagens carismáticas. A maneira como controlamos a ação também está muito bem feita, estando o sistema de evolução e regressão entre formas muito bem executado e que dá aso a várias combinações possíveis. Por outro lado, a falta de uma banda sonora mais diversificada e a falta de checkpoints fazem com que Adventures of Pip perca muita da sua magia.
O que gostamos:
- Cenários e personagens que ficam na memória;
- Alternância entre várias formas;
- Premissa original;
- Diálogos engraçados e situações caricatas.
O que não gostamos:
- Banda sonora com variação praticamente nula;
- Falta e má distribuição de checkpoints criam vários momentos de frustração;
- Ligeiros problemas técnicos.
Nota: 7,5/10