É seguro dizer que desde a segunda metade da década de oitenta, a Nintendo foi responsável pela criação de algumas das franquias e personagens que marcaram a infância de muitos gamers. Super Mario, Zelda, Metroid, Kirby, F-Zero e Donkey Kong são apenas alguns exemplos. Não é novidade nenhuma também que uma das maiores críticas à “grande N” tem sido a sua inflexibilidade e o método quase formulaico com que lança novos jogos das mesmas franquias. Tudo isto mudou em 2015 com o lançamento de Splatoon, uma nova propriedade intelectual, e ARMS, uma das grandes novidades da Nintendo Switch para este ano, continua a tendência de inovação, elevando a fasquia e relembrando os fãs, dos mais novos aos mais velhos, que a Nintendo ainda é a rainha naquilo que faz!
ARMS apresenta-se como um novo jogo de luta bastante diferente daquilo a que estamos habituados e que o torna muito especial: todos os lutadores possuem braços extensíveis como uma “mola” (daí o nome ARMS) e, portanto, os socos têm de ser “projetados” contra o adversário enquanto se controla a sua trajetória. Aliás, grande parte da diversão do jogo passa pelo controlo da física dos golpes, sendo imediata a satisfação quando vemos que aquele gancho em curva pela direita acertou na bochecha esquerda do adversário.
Passámos largas horas com o jogo e podemos certamente dizer que a Nintendo se esmerou (mas tal não é de estranhar) com o sistema de combate que criou. Este é fácil o suficiente de se pegar pela primeira vez, mas difícil de dominar completamente. Muito disto está ligado a quão diversas são as “luvas” (ARMS em inglês, dado que são verdadeiras armas, mais à frente explicamos como funcionam) que as personagens podem equipar: existe um pouco de tudo, desde simples luvas até mini-hélices, mini-misseis e os seus congéneres maiores, bolas gigantes, guarda-sois, pássaros, dragões, “tentáculos” (incorretamente chamados de salamander), lança serpentinas e escudos. Todas estas ARMaS têm dois modos de ataque, o normal e o charged, sendo que quando este último é disferido, o ataque ganha efeitos elementares ou adicionais: fogo, gelo, eletricidade, vento, paralisia, explosão ou cegueira. Para além de toda esta variedade, podemos ainda acrescentar as diferentes habilidades de cada personagem: a Ribbon-girl consegue saltar várias vezes no ar; o Spring-man faz sempre ataques charged quando a sua barra de vida está em baixo; a adorável Min-Min consegue dar um pontapé no ar que repele quaisquer ataques na sua direção; a popular Twintelle consegue fazer charge em pleno ar; a dupla BYTE & BARQ para além de lutarem em conjunto, BARQ serve ainda de plataforma para que o BYTE possa saltar mais alto (para além de uma transformação à Megazord durante o ataque rush); e por aí a fora…
Perante toda esta diversidade de ARMS e de personagens (já lá vamos) com habilidades bastante diversas, é muito importante a escolha das luvas que se levam para o combate (cada personagem pode escolher 3 como um loadout, e depois equipar duas antes de cada ronda, em várias combinações possíveis). Ir preparado para os combates é importante, porque embora adversários mais leves como o Spring Boy, a Ribbon Girl, o Ninjara e a Twintelle possam ser derrubados com dois a três socos, lutadores mais pesados como o Master Mummy e a Mechanica já podem aguentar com mais dano e continuar de pé. No entanto, esta resistência é compensada pela sua mobilidade reduzida face aos lutadores mais leves – e, portanto, mais rápidos. A dinâmica do peso/velocidade também se aplica às luvas, o que significa que é possível parar um soco em pleno ar – desde que a nossa luva seja pesada o suficiente para o fazer – e, acreditem, é aterrorizante sentir que não conseguimos parar as “Megaton” do Master Mummy com as lança serpentinas, que, embora mais rápidas, são demasiado leves. São muitas aqui as possibilidades de customização, sendo possível desbloquear mais ARMS através de um mini-jogo (ARM GETTER) cronometrado, cujos segundos disponíveis dependem das moedas que ganhamos ingame com praticamente tudo o que fazemos. Cada ARM ou “luva” dá um valor predeterminado de dano, independente da personagem que as usar, e como todas as personagens podem potencialmente equipar todos os ARMS, torna-se muito importante treinar, não só os movimentos, mas também as habilidades especiais de cada personagem. É aqui onde reside muito do balanço do jogo.
Existem dez personagens originais e vibrantes por onde escolher, cujo design e personalidades coloridas dão vida ao jogo: Spring Man, uma espécie de Little Mac do jogo mas com braços de mola; Ribbon Girl, uma estrela pop cujos braços são fitas de tecido; Ninjara, um estudante ninja que usa correntes para lutar; Master Mummy, uma múmia… precisamos de dizer mais alguma coisa?; Min Min, pessoalmente a nossa favorita, aqueles braços de ramen noodle conquistam qualquer um; Mechanica, uma humana que construiu um fato especial com braços extensíveis; Twintelle, estrela de cinema e a favorita da internet, que usa o seu cabelo como arma; BYTE & BARK, a dupla robótica homem e cão polícia, que lutam em equipa; Kid Cobra, o puto radical com braços de réptil e Helix, uma personagem misteriosa com origens num laboratório e cujos braços são como que as duplas hélices do ADN. Cada personagem tem uma arena própria, que pode ir desde um estádio a um palco, passando por um ringue de desportos radicais, um laboratório e até mesmo uma taça de noodles gigante. Estas arenas contêm surpresas que podem ser aproveitadas pelos jogadores e até mesmo influenciar os combates. Também existem itens que vão aparecendo e que podem ser utilizados, virando muitas vezes o jogo: sumos de vida ou de rush e bolas explosivas ou paralisantes. Parte da diversão está em nos apercebemos do caos que conseguimos fazer na arena de batalha, com os jogadores a saltarem e deslizarem da direita para a esquerda enquanto desferem socos e tentam fazer grabs, ou até mesmo quando os conseguimos fazer e destruímos parte do cenário, como na arena do Helix. Todavia, como dissemos, por debaixo de toda esta destruição existe um sistema de combate profundo o suficiente para quem nele quiser investir o seu tempo.
Embora o jogo ofereça toda a liberdade na escolha do método de controlo, não há forma de fugir desta afirmação: o jogo foi feito para ser jogado primariamente com os motion controls através dos Joy-Con, um em cada mão, “thumbs up position” (polegares virados para cima). Cada Joy-Con corresponde a um braço, que podem ser disparados à vez, ou simultaneamente para se fazer grab (agarrar o adversário). Se inclinados em conjunto, fazem com que a nossa personagem se movimente nesse sentido, podendo também ser apontados para dentro para nos defendermos, ficando por fim o R/L para saltar e deslizar e o ZR ou ZL para ativar o modo rush. Devo dizer que em toda a minha experiência a jogar motion controlled games, nunca vi melhor implementação da tecnologia. A sensação, sem dúvida também devido à presença do HD rumble, de “lançar” um punho tipo mola, é algo difícil de traduzir para o papel, mas que deve definitivamente ser experienciado por todos os que têm a Switch. Por outro lado, a experiência positiva confirma que a Nintendo consegue, mais uma vez, provar como é possível aproveitar bem os controlos por movimento, o que prova que recentes implementações menos boas da tecnologia só poderão ser culpa de quem não dedicou tempo suficiente a afinar os controlos.
Infelizmente para aqueles que decidirem suar um bocadinho usando os motion controls, nem tudo são «pêros doces», pois o jogo apresenta inadvertidamente dois obstáculos. O primeiro relaciona-se com a dificuldade crescente do jogo em modo “Grand Prix” – o single player arcade do jogo, que possui 7 níveis de dificuldade, e em que após o 4.º nível, os motion controls (embora extremamente responsivos e divertidos) não possuem a finesse de um comando tradicional como os Joy-Con separados na horizontal ou no confort grip ou então como o pro controller, levando a situações bastante frustrantes pela falta de misericórdia do CPU (pensando em perspetiva, também ninguém joga Mario Kart 8 em 200cc com os motion controls, em razão do grau de habilidade necessária). O segundo problema apresenta-se quase como consequência do primeiro: o jogo não diferencia os jogadores que jogam com os motion controls ou no modo tradicional, o que acaba por ser um pouco injusto para os primeiros, dado o maior grau de controlo de que dispõem os que optarem pela opção mais tradicional. Isto leva-nos a crer que se a Nintendo pretende apresentar ARMS como uma potencial categoria de e-sports, idealmente esta será através da utilização do pro controller.
Como já referimos, o jogo possui um modo Grand Prix que se traduz na oferta arcade do título, a ser jogado em single player ou co-op (a dois). Mas o prato principal são todavia as ofertas de multiplayer competitivo, como o Versus, Party Match, Ranked Match, Friends e Local.
O modo Versus permite que até quatro jogadores (na mesma Switch) se confrontem em combates frenéticos. Tanto o Party Match como o Friends permitem que até dois jogadores joguem online num conjunto variado e divertido de modos de jogo. O modo Local permite jogar entre várias consolas localmente. Por fim, o Ranked Match permite apenas a um jogador lutar online para ganhar fama e glória (e rank). Para assegurar a habilidade dos jogadores no modo Ranked, a Nintendo obriga os jogadores a terminarem primeiro o Grand Prix com a dificuldade pelo menos em nível 4. Infelizmente à data da escrita desta análise, apenas conseguimos encontrar uma match no modo Ranked, pelo que não conseguimos subir do rank Snail (caracol).
O jogo possui, para além das lutas tradicionais (Fight) e em equipa (Team Fight), os incrivelmente divertidos modos V-ball (voleibol) em que, ao contrário do desporto na vida real, a bola explode ao bater no chão, e o Hoops (basquetebol) onde objetivo é marcar 2 ou 3 pontos no cesto de basquete, mas cujas bolas são os outros jogadores. Existe também o modo Skillshot que consiste num “tiro ao alvo” frente a frente (onde é importante ter a certeza que o outro jogador não consiga tantos pontos quanto nós, isto através de um soco ou dois despercebidos pelo meio dos alvos), e o 1-on-100 que nos põe perante 100 adversários cada vez mais poderosos.
Graficamente, tanto as personagens como os cenários são lindos de morrer. A Nintendo não brinca em serviço no que toca a mostrar a capacidade gráfica da Switch, que apresenta este título a 1080p e 60fps em modo de um jogador quando a consola está acoplada à Dock e a 900p, quer a 60fps em split-screen de 2 jogadores ou a 30fps em split-screen de 4 jogadores (conforme o teste da Digital Foundry a 18 de maio). É impressionante a fluidez não só nos movimentos das personagens, mas também dos seus braços durante a sua curta viagem para a cara do infeliz que estiver à nossa frente.
Em termos de sonoplastia, o jogo contem primariamente um conjunto de músicas que invocam a glória obtida através do combate. O tema principal do jogo, sofredor de vários remixes, dependendo da arena onde nos encontramos, pelo menos aos nossos ouvidos tem uma determinada influência do espirito desportivo do futebol brasileiro com os seus coros torcedores e com uma solista marcante. Podemos ser apenas nós, mas este tema no estádio do Maracanã estaria plenamente em casa.
A nossa Vídeo-Análise que inclui gameplay de ARMS.
Opinião final:
ARMS, é o novo jogo de luta da Nintendo que vem provar mais uma vez porque é que esta ainda persiste no negócio dos videojogos. Possui um leque de personagens variadas e um profundo sistema de combate com bastantes opções de customização. As ofertas multiplayer locais, tal como o online, são as razões pelas quais continuaremos a jogar este jogo durante muitos e longos meses. É familiar como jogo de luta, mas são as suas mecânicas que fazem toda a diferença, como tal os fãs de jogos de luta não o quererão perder!
Do que gostamos:
- Motion Controls perfeitamente implementados;
- Profundo sistema de combate com bastantes opções de customização;
- Min-Min.
Do que não gostamos:
- O jogo não separa os jogadores online que usam os motion controls dos que não os usam.
Nota: 9/10