Quando foi lançado, Fire Emblem Awakening iria ser o suposto canto de cisne da franquia na 3DS, mas na verdade acabou por dar novo fôlego à série. Fire Emblem Fates foi uma maneira pouco convencional de lançar três Fire Emblems em simultâneo, roçando o muito bom e o “outra vez arroz?”. Fire Emblem Echoes: Shadows of Valentia é, no entanto, aquele jogo que está na linha entre o Excelente e o quase perfeito.
Aquando do anúncio deste Fire Emblem, a Nintendo Switch tinha sido apresentada com um line up de lançamento não muito forte. Haver um Fire Emblem nos primeiros meses de vida seria um foguetão poderoso para aumentar ainda mais as vendas; os jogadores já estariam a acabar o grande Breath of the Wild e saltavam logo para o próximo grande jogo. Mas continuando na linha dos anteriores lançamentos, a edição do mais recente título Fire Emblem foi mais uma vez privilegiada na portátil da Nintendo, adicionando mai um grande título ao excelente catálogo desta. Não é desta Switch, ainda não é desta.
No mundo de Shadows of Valentia existem dois deuses: Duma e Mila, que lutam entre si. Ele é apologista do poder e da conquista, ela do ócio e da paz. O continente divide-se e nascem duas civilizações que seguem estas mesmas doutrinas, mas os homens de Duma esquecem-se da sua humanidade e os de Mila tornam-se opulentos e corruptos. Não há aqui um bem contra o mal, porque ambos os lados têm os seus defeitos. Nisto conhecemos duas crianças, Alm e Celica, que partilham uma marca na mão. E claro que o destino faz das suas e atira estas crianças, alguns bons anos depois, para o meio de um conflito que só eles podem parar. Alm, é agora o recém líder dos rebeldes contra o Império (bem à moda de Star Wars) e Celica alguém que acha que pode resolver tudo sem violência, mas que acaba por reunir um grupo de mercenários e guerreiros de fazer inveja ao companheiro. No fim, duas histórias, caminhos separados que se unem no final.
Fire Emblem Echoes é um remake extenso de Fire Emblem Gaiden, lançado em 1992, apenas no Japão. É a primeira vez que o Ocidente o recebe e não podia ser de melhor maneira. Echoes agarra-nos logo com o estilo visual diferente de Hidari e Akio Shimada, as sequências animadas são um mimo para os olhos e é pena só acontecerem em pontos fulcrais da narrativa. Já as restantes sequências decorrem no motor de jogo ou no já familiar estilo visual novel. A novidade é que todas as sequências, desde as mais elaboradas às mais simples, têm todas vozes. Até as personagens mais secundárias tiveram direito a este tratamento e felizmente são todas agradáveis o suficiente, não nos obrigando em momento algum a baixar o som da consola… e habituem-se, porque as personagens falam que se fartam, seja onde for.
Echoes é um jogo agradável em todos os sentidos, mas as novidades não se ficam pela estética. O ponto fulcral da série é o combate: há várias mecânicas que regressam de jogos anteriores para dar aquele travo de old school mas a puxar para os tempos modernos. E ainda há outras que saíram (quer gostem ou não). Podem dizer adeus à simulação de casamentos e dos filhos, e depois da desculpa dada na prequela, não fazia sentido regressar, nem deixa saudades. Os ataques em par também passaram à história, mas continuamos a ter suportes (fomentados com conversas) que aumentam os nossos atributos e num caso especial podemos lançar um ataque em trio. O combate foi melhorado, está claramente refinado e há espaço para a experimentação e para correr alguns riscos – sempre bem calculados. Os arqueiros já não estão limitados ao espaço de duas casas, podendo atacar mesmo junto ao adversário. E se evoluírem a personagem podem aumentar a área de ataque; os healers também viram as suas competências aumentadas. Agora já não se limitam a curar e a fugir do campo de batalha, tendo um leque adicional de magias de ataque e, com sorte ou boa técnica, podem dar conta dos inimigos.
Para evoluírem e, consequentemente, promoverem uma personagem já não precisam de itens especiais, basta visitar um altar e escolher uma das várias classes disponíveis. Há algo que ainda estranho e me tem dificultado um pouco as batalhas – mas talvez seja só de mim -, nos jogos anteriores podíamos equipar a personagem com várias armas e vários itens curativos, mas neste Echoes, as armas estão equipadas de acordo com a classe e, se quisermos equipar armas mais poderosas, não podemos equipar itens curativos ou escudos. Aqui cabe ao jogador fazer uma microgestão e antecipar o cenário. Dando um exemplo mais concreto, em Echoes as armas não partem nem as magias se esgotam, apenas consomem uma quantidade mínima de HP do mago/healer. Um toque macabro, mas perfeito. Então, se estiverem numa batalha onde a magia seja importante, equipem essas personagens com itens regenerativos ou poções. Um mapa com areia, onde só as vossas unidades montadas podem andar? É melhor equiparem um bom escudo. Claro, se tudo correr mal, podem recorrer a uma mecânica nova que tem o nome de Mila’s Turnwheel e que permite recuar no tempo para recuperar jogadas e optar por alternativas que não levem à morte dos nossos companheiros. De início o uso é limitado, mas se apanharem mais rodas dentadas conseguem recuar mais vezes.
Também nas batalhas, tenho de dar destaque à mecânica de Tácticas com as suas opções automáticas de ataque ou de agrupar, entre outras. Isto permite-nos descansar um pouco os olhos naquelas batalhas aleatórias sem dificuldade. E este jogo tem batalhas aleatórias o suficiente para não estarem níveis abaixo dos vilões e sentirem na pele aquela frustração muito típica e saudosista dos Fire Emblem anteriores. Basta andarem pelo mapa mundo, uma tradição que se mantém, que os inimigos aparecem. Ao longo deste mapa, poderão visitar aldeias e masmorras livres para explorar. Explorar as masmorras e templos é algo interessante porque aborda uma mecânica diferente, em que temos a opção de mudar para um modo 3D e controlar o herói. Não é nada que não tenhamos visto noutros jogos, mas é uma novidade em Fire Emblem e que gostaria que fosse expandida em sequelas. Há objetos a destruir e os inimigos andam pelo mapa, se os atacarmos primeiro, o ecrã muda para o campo de batalha fiel à saga. Se formos apanhados pelos inimigos, eles começam primeiro e em maior número. Quantas mais batalhas fizermos, mais cansadas ficam as nossas personagens – a fadiga é real e se combaterem cansados, terão o HP reduzido, assim como outras penalizações.
Já nas aldeias podem falar com a vossa equipa e habitantes, receber quests e ganhar fama. Visitar os ferreiros, por exemplo, é importante porque podem melhorar as armas, e para tal só precisam de moedas – que encontram espalhadas pelo mapa ou nos inimigos. No modo Examinar, que imita um pouco os point and click, cliquem no cenário para apanharem itens ou memórias.
Pode-se dizer que este jogo é quase todo sobre memórias. Começa com um prólogo novo para este remake; as nossas personagens não se lembram muito bem de quem são e os pedaços de memórias que apanham vão revelando um pouco da história das personagens secundárias e dos vilões. Drama que é drama adora personagens com passados atormentados e esquecidos, e aquele cliché da personagem a revelar-se é tão especial (apesar de batido até à exaustão) que não dá para odiar. Podem ir saltitando entre a narrativa de Alm e a de Celica, tudo isto com um premir de botão no mapa mundo – mostrando que podemos ter duas narrativas entrelaçadas sem ter obrigatoriamente dois cartuchos de jogo – sim Fates, estou a olhar para ti.
Com tudo isto, preparem-se para umas boas horas de imersão. E se acharem o jogo curto, não se preocupem, vem aí o belo do Season Pass para jogarem mais e mais – podem contar com a nossa opinião sobre esses conteúdos para breve.
Opinião final:
Shadows of Valentia é um exemplo de um excelente remake. Os visuais animados, a banda sonora fantástica, o leque de personagens que foge ao copy/paste do Fates, as novas mecânicas e a melhoria das antigas fazem desta entrada uma das melhores da portátil 3DS, ainda que a última.
Do que gostamos:
- É um Fire Emblem!;
- O sistema de batalha está mais refinado;
- Modo de exploração;
- Banda sonora e visuais.
Do que não gostamos:
- Ter saído apenas na 3DS quando a Switch já aí anda.
Nota: 10/10