Através de uma iniciativa tomada pela Nintendo vários jogos da Wii têm chegado à Nintendo eShop da Wii U com algumas melhorias e funções extra, para além de um preço muito mais convidativo do que aquele a que se encontravam originalmente.
Resultante desta campanha Pandora’s Tower, um JRPG (Role Playing Game produzido no Japão) lançado originalmente para a Wii no dia 13 de abril de 2012 (na Europa), é agora relançado para a Wii U no dia 16 de abril de 2015, ou seja, aproximadamente 3 anos mais tarde.
Muitos jogos japoneses, aliás, a maior parte, são lançados inicialmente apenas para esse mercado e não rara é a ocasião em que nunca chegam a sair em outras regiões. O caso de Pandora’s Tower poderia muito bem ter sido idêntico, demorando aproximadamente um ano desde o seu lançamento no Japão para chegar às consolas Wii europeias (não esquecer que a Wii tinha bloqueio por região, o que tornava impossível jogar títulos vindos do Japão numa consola comprada em qualquer outra parte do mundo) e dois anos até ser lançado no mercado norte-americano, num movimento que nos trouxe também Xenoblade Chronicles e The Last Story -outros JRPGs de grande peso na consola. Embora não confirmado pela Nintendo estes três títulos poderiam nunca ter chegado ao ocidente caso não tivesse existido a Operation Rainfall, uma petição que alcançou grandes proporções e que procurava convencer a Nintendo a publicar os mesmos também na Europa e América do Norte.
Pandora’s Tower , dos três jogos mencionados em cima foi exatamente o último a ser lançado e um dos últimos grandes títulos a chegar à Wii, que deu lugar à Wii U no final desse mesmo ano. Neste jogo somos transportados até Imperia, um grande império que engloba dez reinos de entre os quais se destacam Athos, Okanos e Elyria. Elyria é o maior reino e governa os demais desde o final da guerra da unificação, numa organização similar à do Reino Unido em que a sede do governo se situa em Inglaterra e exerce o seu poder sobre os demais constituintes, como por exemplo a Escócia. Passados 511 anos desde o fim da guerra e portanto da junção de todos os reinos, e devido a uma situação de grande instabilidade no império, vários reinos revoltam-se incluindo Athos. Aeron, personagem principal pertence a este reino mas nutre de uma forte amizade por Elena, uma cantora de Elyria.
Nos momentos iniciais do jogo encontra-mo-nos em Helycon, capital do reino da protagonista, a tempo de um festival para celebrar as boas colheitas. Neste festival Elena demonstra como canta maravilhosamente interpretando um tema de forma belíssima, tanto pela graciosidade da sua voz quer pelos enfeites do espetáculo que acompanham a apresentação. Subitamente, uma grande invasão toma lugar arruinando a magistral apresentação. Aeron, que se encontrava disfarçado na plateia a assistir ao concerto, ao aperceber-se do perigo em que se encontrava a companheira corre à sua procura para assim escaparem do tumulto. Quando a encontra, o jovem guerreiro repara que uma grande marca ocupa agora quase a totalidade das suas costas. Esta marca, segundo Mavda, uma feiticeira que encontram pelo caminho e que os ajudará ao longo de toda a aventura, trata-se da marca da maldição, maldição essa que transforma gradualmente as suas vítimas em bestas.
No reino de Elyria quando alguém tem a infelicidade de ser amaldiçoado é imediatamente executado, e, por isso, este pequeno grupo escapa imediatamente de Helycon e de toda a confusão que se instaurara para encontrar algum local em que possam estar a salvo. Esta jornada leva-os até Okanos, um dos reinos vizinhos e de clima desértico, mais precisamente a uma base militar há muito não utilizada- O Observatório– cuja missão é de supervisionar a «The Scar», uma fenda gigantesca que outrora ameaçou consumir o mundo inteiro e que apenas não se alastrou (e alastra) devido à presença de 13 torres no seu centro ligadas às bordas do abismo por 12 correntes enormes.
Aqui Elena fica a conhecer melhor, mais uma vez com a ajuda de Mavda, como pode atrasar a sua transformação e possivelmente curar a maldição. A única alternativa é mesmo comer carne de besta, o que se revela um problema por 3 motivos. O primeiro é de que a protagonista, sendo uma habitante de Elyria é também crente na religião Aios- uma religião politeísta em que um dos mandamentos impede o consumo de qualquer tipo de carne. O segundo é o aspeto medonho que têm e que impediriam qualquer um de sequer se aproximar. O terceiro é a maneira como se obtêm estes pedaços de carne; para Elena se conseguir manter na sua forma humana, Aeron tem de se aventurar até às torres no centro da «The Scar» já que as bestas há muito que só habitam nesse local. Por 511 anos nenhum humano entrou nestas torres e por isso as bestas agora controlam-nas, pelo que Aeron terá várias ao seu dispor, se bem que estas estão também sedentes por carne fresca e por isso mais perigosas.
As bestas comuns que Aeron mata nas torres não têm poder suficiente para dissipar a marca da maldição, o que torna a situação dramática. Segundo Mavda apenas existe uma hipótese de Elena se ver livre da sua sina – comer a carne de todos os mestres. Os mestres são bestas muito poderosas e colossais que controlam cada uma das 13 torres, correspondendo aos bosses de Pandora’s Tower. Assim, o objetivo do jogo passa por explorar cada um destes locais, que correspondem às comuns dungeons, para derrotar o mestre correspondente.
À medida que vamos explorando estes locais inóspitos, somos confrontados com um desafio que poderá ser considerado o maior de todo o jogo: o tempo. Tal como dito anteriormente, Elena vai-se transformando progressivamente em besta, assim, temos de encontrar e defrontar cada um dos mestres o mais depressa possível. À medida que vamos jogando, uma pequena barra circular no canto do ecrã vai diminuindo, barra essa que corresponde ao tempo restante até que Elena se transforme totalmente. Se levarmos até ela carne de bestas vulgares, a barra estabiliza temporariamente, isto é ganhamos algum tempo, voltando a barra apenas a encher quando defrontamos um mestre e lhe levamos a sua carne.
Todo o jogo gira em torno disto, um constante ir e vir entre as torres e a base militar. Saímos de manhã para defrontar mais uma série de perigos, tentamos matar o mestre antes do fim do dia e voltamos para o Observatório antes que seja tarde de mais e Elena se transforme totalmente numa besta- o jogo não perdoa neste ponto e a nossa aventura chega mesmo ao fim caso não sejamos bem sucedidos. Não existe qualquer variação neste aspeto ao longo de todo o jogo, o que acaba por o tornar repetitivo, e para colmatar esta ausência de mudanças pouco é feito com a excepção da evolução da história e da relação entre Elena e Aeron, que evoluirá dependendo das escolhas tomadas por nós (que controlamos Aeron). A relação entre os mesmos está representada de maneira soberba em que sentimos mesmo um ambiente romântico de incertezas, avanços e recuos e de familiaridade ou discussão entre estes dois personagens que se destacam pela maneira como exprimem as suas emoções muitas vezes sem proferir uma única palavra.
De maneira a «quantificarmos», se é que é possível fazê-lo, a relação entre os dois temos a Oraclos Chain, uma corrente passada de geração em geração entre os Vestra, povo de Mavda, que une os dois amigos. Este objeto estabelece uma forte ligação que vai ganhando mais poder à medida que estes ficam mais próximos. Quando Aeron parte em direção às torres é também esta corrente que o acompanha e que lhe serve de arma, para além de instrumento para se segurar em paredes com saliências, apanhar a carne necessária para Elena – entre outras funções.
Embora seja um RPG, o combate e o modo de jogar Pandora’s Tower é mais voltado para a ação parecendo à primeira vista o comum jogo de aventura na terceira pessoa, distinguindo-se por contar com evolução das personagens, mais especificamente na maneira como se relacionam, e pela necessidade de controlar muito bem os itens que possuímos devido ao espaço disponível.
Para além dos pedaços de carne que trazemos das torres encontramos também uma grande variedade de objetos mais ou menos úteis para Aeron mas que podem ser igualmente vendidos a Mavda, que em troco nos dará dinheiro que podemos gastar para comprar: ou outros itens ou presentes para Elena, de maneira a assim a alegrarmos, melhorando os laços que estabelecemos com ela.
A já referida história do jogo é um dos maiores pontos positivos de Pandora’s Tower, não apenas pela ligação que vamos estabelecendo com Elena e Aeron mas também pelo facto de que somos realmente transportados para dentro do jogo e interagimos com eles, na medida em que é o jogador que decide o rumo da história que termina em 4 finais diferentes.
Visualmente, e tendo em conta o hardware da Wii, o jogo comporta-se bem, apresentando personagens com aspeto idêntico ao que estamos habituados a ver em Final Fantasy, e outros jogos do género, mas com a sua identidade própria. As cinemáticas estão particularmente bem trabalhadas ajudando e muito a fortalecer a nossa relação com as personagens e prendem-nos a este fantástico mundo de Pandora’s Tower. Gostaria ainda de destacar os mestres, as bestas enormes que como já referido encontramos no final de cada torre, que estão muito bem desenhados, cada um representando um elemento (metal, floresta etc.), bem como diferentes formas de nos por à prova.
Neste quesito apenas tenho de lamentar que, e tal como acontece nos outros títulos Wii relançados para a Wii U, não existam melhorias, aliás, um dos grandes problemas ainda se mantém- o serrilhado. Quando se liga uma consola Wii a uma televisão HD nota-se perfeitamente que os contornos e traços dos vários personagens e objetos do cenário estão tremidos, o que prejudica significativamente a qualidade visual do produto. Sendo a Wii U uma consola HD é imperdoável que nada tenha sido feito para resolver este problema ou pelo menos para tentar atenuá-lo já que é em TVs de alta definição que praticamente todos os detentores da Wii U jogam.
Assim, caso não consigam ignorar este problema ou não consigam arranjar alguma estratégia como jogar a uma maior distância do que o habitual (estratégia que adoptei), então talvez a versão original seja a mais indicada caso ainda possuam uma Wii. A única diferença neste lançamento é o facto de que podem jogar só no Wii U GamePad, isto é, sem utilizar a Tv (modo off-screen)-quer controlando o jogo através dos botões do próprio comando, quer usando a barra de sensores para controlar o jogo através de um Wii Remote.
Pandora’s Tower conta ainda com uma banda sonora brilhante, das melhores se não a melhor que já tive a oportunidade de ouvir durante a minha experiência como jogador. Desde uma adaptação da fantástica Love Dream de Franz Lizst, que resulta na música Eternal Blessing (o tema que Elena interpreta de forma divinal no jogo) até ao trágico primeiro movimento da sinfonia «Patética» de Tchaikovsky a música de fundo está sempre muito bem adaptada ao que se passa no ecrã, para além de valer por si só. Para finalizar, fiquem com Eternal Blessing e rendam-se, ou pelo menos assim o espero, à bela voz de Elena:
Opinião final:
Embora quando saiu tenha sido um pouco negligenciado pela crítica e pelos jogadores e considerado o pior dos 3 JRPGs mencionados em cima, considero Pandora’s Tower, embora peque pela falta de mudanças ao longo da aventura e, nesta versão, por não trazer melhorias significativas, um grande jogo. O Universo de Pandora’s Tower, a relação dos personagens, o sentimento de pressão causado pela falta de tempo e os vários momentos memoráveis tornam este título no que acho ser das melhores despedidas que a Wii poderia ter e que volta agora para a Wii U exatamente como estava em 2012. É, em suma, um título mais que recomendado para qualquer um que goste de JRPGs e que ainda não o experimentou, mesmo com as suas eventuais falhas.
O que gostamos:
- Banda sonora impecável;
- História e relação de Elena e Aeron;
- Cinemáticas belíssimas;
- Jogabilidade divertida e desafiante;
O que não gostamos:
- Fases de jogo muito idênticas entre si;
- Ausência de grandes novidades nesta versão;
- Existência de pouca variedade de armas;
Nota: 8/10