Análise – Project Zero: Maiden of Black Water

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Durante anos a jogar apenas PC e como fã de tudo o que o entretenimento pode oferecer no que toca a terror, Project Zero foi uma espécie de “baleia branca” para mim, aquela obra intocável que prometia ser ainda mais aterrorizante do que tudo o que tinha jogado até então. Fez-me tentar juntar dinheiro para uma PS2, sem sucesso, e durante mais uns anos permaneceu um desejo não realizado.

Quando finalmente consegui pegar não apenas no primeiro, mas em (quase) todos os Project Zero, foi como se fechasse um ciclo na minha vida. Finalmente tinha apanhado a “baleia branca”. Apesar de não ter sentido o extremo horror que me era prometido, Project Zero foi das poucas experiências a nível de videojogos que teve o conjunto de uma atmosfera perfeita, banda sonora, história e mecânica original, que conseguiu criar uma experiência inigualável no que toca ao género.

É indubitavelmente uma das franchises de survival horror mais aterrorizantes da história dos videojogos e assim que anunciaram que o quinto capítulo da saga iria agraciar-nos no Ocidente – ao contrário da sua iteração na Wii – foi impossível não me sentir não só feliz, mas também entusiasmada, um pouco apreensiva até. Será que Project Zero iria conseguir manter o seu encanto anos depois, ou iria sucumbir ao mal que parece afligir franchises como Silent Hill e Resident Evil?

Maiden of Black Water chega-nos este mês à Wii U, bem a tempo do Halloween e promete amplificar a experiência terrorífica ao colocar-nos em pleno controlo da Camara Obscura, emulada através do gamepad da Wii U. Após um lançamento apenas no Japão, Project Zero vem também completamente localizado, com vozes e textos em Inglês – mas com uma edição física extremamente limitada, focando-se maioritariamente no mercado digital. Quase como se fosse uma experiência para avaliar o interesse para futuros lançamentos.

No Monte Hikami vão encontrar várias personagens, a maior parte mortas.

No Monte Hikami vão encontrar várias personagens, a maior parte mortas.

Project Zero: Maiden of Black Water vem provar que a franchise está viva e recomenda-se, abrindo o gostinho por futuros títulos da série. No entanto é impossível jogar este sem estabelecer uma comparação com os títulos anteriores, mesmo já sem falar nas mecânicas de combate. Longe vão já os controlos à tanque, rígidos, com ângulos de câmara fixos tão típicos dos survival horrors. À semelhança do remake de Crimson Butterfly, aqui temos a câmara fixa por detrás da nossa personagem, sendo possível movimentar ambas sem estarmos limitados. Quer dizer, muito limitados. Mas já lá vamos.

Em termos de história, esta continua a ser um dos pontos fortes de Project Zero, tocando em temas já muito comuns em toda a série. Rituais misteriosos, figuras femininas fantasmagóricas cujo propósito é desconhecido, a necessidade de salvar alguém amado. O cenário é o Monte Hikami, local que muitos visitam para cometer suicídio e onde muitas pessoas desapareceram sem deixar rasto. Tanto os corpos de água como os abandonados templos que permeiam o monte estão intimamente ligados às Shrine Maidens – que no passado ai viviam e auxiliavam aqueles que procuravam a morte, a tê-la de forma pacífica, mas com um elevado custo. No presente, a história segue três protagonistas, cada um com a sua motivação que os irá levar até ao Monte Hikami. A água é o elemento que liga todo o jogo e a sua temática é extremamente notória em todos os aspetos.

Como em qualquer outro Project Zero, não leiam muito sobre o enredo. O mesmo e tudo o que o rodeia vai sendo posto a descoberto lentamente à medida que avançam o jogo, através de cutscenes e diversos diários e documentos que vão encontrando e é um prazer ir descobrindo até onde vai a história do Monte Hikami. Ao longo da narrativa, poderão controlar três personagens diferentes: Miu Hinasaki, a filha da protagonista de outros títulos da série e que desapareceu sem deixar rasto; Ren Hojo, um escritor que visita o Monte em virtude da pesquisa que está a levar a cabo para o seu livro; e Yuuri Kozukata, cuja habilidade de transpor objetos e pessoas do mundo das sombras para o nosso mundo se tornará muito valioso e dando o mote para uma das mecânicas de jogo.

Os habitantes do Monte são tudo menos simpáticos.

Os habitantes do Monte são tudo menos simpáticos.

Tendo o Monte Hikami como cenário, podem contar com muitas porções do jogo a explorar a floresta e as suas subidas. No entanto, caso se perderem podem sempre utilizar psicometria, permitindo que a sombra da pessoa que seguem se materialize por breves momentos, providenciando assim um auxílio caso o jogador não saiba por onde seguir. Esta mecânica tanto é útil como rapidamente se pode tornar numa “muleta” que invalida a exploração. Não esperem ter o Monte todo para explorar de uma vez. Cada capítulo de jogo leva-vos a uma localização que será relevante para a porção da história em questão, limitando um pouco a exploração e guiando o jogador por vezes pelo caminho mais correto, quer seja pela aparição repentina da sombra da pessoa que seguimos ou apenas por um aviso como “A fulana X não foi por aqui.”, empurrando-nos suavemente para o caminho certo.

E isto leva-nos ao um dos pequenos problemas de Maiden of Black Water: a extrema linearidade. Apesar de existirem alguns mapas cujos vários caminhos incitam à exploração, não existe grande recompensa para o fazerem para além de apanharem itens extra. Ao contrário dos outros jogos da série, não existem assim tantos espíritos para irem fotografando e as oportunidades para os apanharem para a posteridade por vezes limitam-se às aparições das sombras – ou até a aparições hostis. Não esperem também puzzles e quebra-cabeças, os mesmos são inexistentes. Mas pensam vocês: “Epá mas ainda assim vale a pena explorar porque dá jeito ter mais filme para a câmara, certo?”

Errado. Ainda que, mesmo em Normal, noutros títulos da série poderia acontecer começarem a sentir falta de filme mais poderoso, o mesmo não acontece aqui. Ao iniciarem o jogo apenas poderão escolher entre duas dificuldades, Easy e Normal e acreditem que não exagero quando digo que muitas vezes tive que ir ver se não estava por erro a jogar em Easy ao invés de Normal. A dificuldade é muito, muito baixa. Não só os inimigos não são assim tão difíceis, como a sua pouca variedade acaba por resultar em combate com os mesmos espíritos várias vezes, até ao ponto de saberem de cor os seus padrões de ataque.

Para agravar um pouco mais, as únicas instâncias em que Maiden of Black Water é de fato difícil passam apenas pela criação de uma falsa dificuldade através de um checkpoint mais manhoso e que após um passo em falso vos atira quase para o início do capítulo ou de uma sequência completamente ridícula que quase apenas pode ser passada por sorte. Como assim? Falo-vos de uma sequência em que simplesmente têm de fugir por caminhos estreitos, enquanto o espírito que vos persegue vai aparecendo no meio do caminho, sem qualquer padrão ou aviso, matando-vos se apenas lhe tocarem. Sequências como esta última em nada adicionam ao desafio e apenas trazem uma quebra de ritmo adicionando frustração desnecessária, obrigando o jogador a repetir a mesma sequência dezenas de vezes só porque sim.

O detalhe das localizações não foi descurado e contribuem para o ambiente inquietante

O detalhe das localizações não foi descurado e contribuem para o ambiente inquietante

Infelizmente, a repetição acaba por ser algo que acontece demasiadas vezes ao longo do jogo. Desde as visitas constantes a caminhos já explorados só porque estamos no início de um capítulo (sem qualquer outro motivo ou até elemento diferenciador) até momentos em que o jogo parece querer atirar-nos com todos os inimigos já encontrados até então, um de cada vez.

A sensação de deja vu permeia o jogo e infelizmente acaba por roubar à atmosfera de terror perfeita que o mesmo consegue criar. Não só a banda sonora e efeitos são perfeitos, todo o ambiente escuro e desolado da floresta e edifícios consegue criar um ambiente pesado e tenso. Este é também bastante auxiliado pela utilização do gamepad da Wii U como se fosse a própria Camara Obscura. Apesar de o jogo estar permeado de momentos de sustos baratos providenciados pela mão fantasmagórica que aparece aleatoriamente quando tentamos apanhar algum item, é impossível negar a tensão que é criada quando temos que segurar o gamepad na nossa frente e usar o mesmo para combater espíritos inimigos. Esta mecânica está implementada na perfeição e sinceramente será difícil considerar qualquer outro futuro jogo da série sem este tipo de controlo. É a união perfeita e apenas poderia ser melhorada caso o controlo da personagem em si não fosse tão tosco e tão similar aos controlos arcaicos dos primeiros survival horrors. A falta de fluidez pode ajudar a aumentar a tensão, mas por vezes é apenas chato e completamente desadequado do padrão que foi estabelecido pelos jogos atuais.

Graficamente, estamos a falar da Wii U portanto não esperem maravilhas da nova geração. Ainda assim, a atenção ao detalhe é imensa e é impossível não ficar deslumbrado com o espírito cuja aparência e movimentos evocam uma morte submersa ou até com a nossa personagem, encharcada até aos ossos e, consequentemente muito mais vulnerável a aparições malignas. O design dos cenários consegue aliar-se à atmosfera etérea e pesada, com pequenos detalhes que nos vão arrepiando e inquietando. É perfeitamente normal terem medo daquelas bonecas ali no canto. Ainda assim, não consigo deixar de pensar que teria sido extremamente interessante terem pegado mais no conceito de o Monte Hikami ser um lugar para morrer.

Existem momentos aqui e ali que aludem a isso mesmo mas o Monte em si poderia ter sido uma caixinha de surpresas e de medo ao invés de meia dúzia de cenários repetidos pelos vários capítulos.

Apesar de vários pontos negativos, Maiden of Black Water é tudo aquilo que um fã de Project Zero poderia querer. Continua fiel a si mesmo, com a adição muito bem-vinda de um gamepad que parece ter sido feito para este jogo e prometendo uma experiência aterrorizante, bem na tradição de um survival horror. Principalmente depois de o terminarem e desbloquearem a dificuldade Nightmare.

Opinião final:

Em suma, Project Zero: Maiden of Black Water será um mimo tanto para os fãs de jogos de terror como para os fãs do franchise. No entanto, apesar de ser bem-sucedido como uma peça de entretenimento de terror, é um pouco menos bem-sucedido como parte da saga que o precede, quase que levando o jogador pela mão em determinados momentos. De todo o modo, é bom ver que o género está vivo e recomenda-se, esperando que o lançamento deste título signifique que voltemos a ver muitos mais e melhores jogos de Project Zero.

O que gostamos:

  • Implementação perfeita do gamepad da Wii U como a Camara Obscura;
  • Narrativa que incita o jogador a explorar os cenários e descobrir mais sobre a história do Monte Hikami;
  • Ambiente de terror pesado e perfeito para um survival horror.

O que não gostamos:

  • Dificuldade extremamente baixa, sem puzzles ou desafios no combate;
  • Pouca necessidade de exploração;
  • Controlos da personagem em si pouco fluídos.

Nota: 7/10