Muitos conhecem o nome Harvest Moon, mas o mesmo já não se pode dizer de Story of Seasons. Após o seu lançamento em 1996, Harvest Moon apaixonou os fãs com a sua simulação relaxada de uma vida calma de agricultor. Como acontece com muitos títulos populares, foi espremido até ao tutano com sequela atrás de sequela – com uma qualidade no mínimo inconstante.
Após o aclamado Friends of Mineral Town, lançado para o Game Boy Advance em 2003, a série nunca mais foi a mesma. Em 2015, e após uma pequena guerra de visões artísticas, a Marvelous Inc. decidiu tocar ao som do seu próprio trombone e seguir o seu caminho: e assim nasceu Story of Seasons, ficando o nome Harvest Moon do lado da Natsume, que continuou a lançar os seus próprios títulos da franquia.
Apesar de gostar bastante deste tipo de jogos, confesso que Story of Seasons me passou um pouco ao lado. A reputação pouco estelar dos mais recentes títulos de Harvest Moon e a recepção morna que Story of Seasons teve fizeram com que este título ficasse na lista dos “jogos para jogar um dia”. Mas a Marvelous Inc. não ficou parada e manteve-se decidida em manter o compromisso de dar aos jogadores uma boa experiência agrícola, e assim nos chega este Trio of Towns.
Todos temos um sonho e a aspiração de vida da nossa personagem em Trio of Towns é a de ser um grande agricultor/a. O pai da nossa personagem, desmancha-prazeres que é, mantém-se firme na sua ideia de que a nossa capacidade agrícola é, no mínimo, ridícula. Depois de muita insistência (e porque não teríamos jogo de outra forma), o papá lá deixa a sua cria ir para a quinta, sob a alçada do seu tio Frank. O que se segue é uma sequência introdutória às mecânicas de jogo básicas que, ao invés de dar o mote e criar vontade de descoberta, acaba por quase fazer com que o jogador morra de tédio, sem terem passado sequer 10 minutos.
Recentemente, só me lembro de ter passado por tal tortura com o início de Okami (com o resto do jogo a compensar e muito) e cheguei a um ponto em que confesso que já passava os diálogos a correr só para finalmente poder meter as mãos na massa. O pior da sequência introdutória de Trio of Towns é que poderia facilmente ser substituída por uma abordagem mais interactiva, deixando o jogador explorar e descobrir um pouco mais as mecânicas de jogo por si próprio. Ao invés disso, o que temos é um descarregar gigante de informação em pouco tempo, o que é tudo menos o ideal quando queremos criar interesse no jogador.
As mecânicas de jogo e diversos eventos que vão sucedendo no mundo vão sendo “apresentados” a pouco e pouco. E quando digo a pouco e pouco, quero dizer de eternidade a eternidade. Cada nova mecânica ou evento é geralmente apresentado no início de um novo dia, com conhecidos ou completos estranhos a fazerem-se de convidados na vossa casa. De cada vez que isto acontecia, já ficava com arrepios na espinha à espera de uma conversa que nunca mais acaba. Neste aspeto, Trio of Towns acaba por ser como aquele vizinho chato que tentamos evitar porque se não, já sabemos que vamos ficar presos com conversa da treta.
Quanto às mecânicas de jogo relacionadas com a quinta, aqui não temos grandes novidades, tendo tudo aquilo a que os jogadores já estão habituados – plantações diversas e colheitas, animais de quinta e até um animal de estimação, que poderá ser um cão ou um gato. Apesar de na teoria os animais de estimação parecerem uma adição engraçada e até possivelmente interactiva, acabam por ser um elemento bastante passivo. Podemos andar pelo mundo de jogo sempre acompanhados do nosso animal de estimação, mas não podemos entrar em estabelecimentos comerciais com ele – o que se torna um impeditivo para andarmos com o bicho atrás. Caso queiramos que ele fique na sua casota ou mesmo dentro de casa, o seu comportamento limita-se a ficar onde foi mandado, dando a sensação de ser mais um objeto de mobília que outra coisa qualquer. Ainda assim, os animais de estimação fazem parte da componente de Streetpass de Trio of Towns, visitando as cidades de outros jogadores e trazendo alguns itens consigo.
Trio of Towns não se chama assim à toa. À medida que vão avançando no jogo, vão sendo desbloqueados os caminhos para as três povoações que rodeiam a encruzilhada principal do mundo: Westown, Lulukoko e Tsuyukusa. Cada uma destas aldeias tem uma temática bem definida: Westown é, como o nome indica, uma aldeia bem ao estilo western; Lulukoko tem um ar tropical, com os seus habitantes a desfrutarem dos bens do mar; e, finalmente, Tsuyukusa é de inspiração asiática, que se reflecte nos seus edifícios e nas vestes dos seus habitantes. Estas diferenças criam variedade não só nos itens que podem obter, como também nos ambientes visitados, mas não consigo deixar de sentir que as diferenças são um pouco forçadas. Estamos a falar de ambientes bem distintos que são facilmente acessíveis entre si, a pé, e sem grande esforço, mas que no entanto acabamos por ter a sensação de que estamos a viajar entre países, e não aldeias.
As diferentes cidades acabam por ter um grande papel no objectivo do jogo. Existem indicadores das relações estabelecidas, nomeados como Town Link Rank. Estes indicadores são aumentados ao enviar colheitas e produtos para as aldeias, assim como fazer alguns trabalhos de part-time para os seus habitantes. Por vezes, os Town Link Ranks podem ficar como que ”congelados”, obrigando a que certos critérios sejam cumpridos para que sejam desbloqueados. Adicionalmente, existem Farm Tips – condições que devem também ser cumpridas, tais como ter duas vacas na vossa quinta, que depois resultam em importantes recompensas. Estes pequenos critérios ajudam a criar objectivos adicionais ao jogo, dando uma ligeira direcção a jogadores que se possam sentir mais perdidos, com tanto por fazer e com tão pouco tempo.
O tempo em Trio of Towns passa a correr e é fácil passarem um dia inteiro sem conseguirem fazer tudo o que queriam. Uma gestão das tarefas diárias é extremamente importante, assim como da stamina que se reduz mais rapidamente do que estarão à espera. Este último aspecto pode ser colmatado ao consumirem refeições – que podem comprar nos restaurantes ou fazer em casa. A melhoria das vossas ferramentas eventualmente também ajudará a que consigam fazer mais e mais num só dia, uma vez que ferramentas melhores exigem menos esforço e, logo, menos stamina. Tudo aquilo que vão fazendo no vosso dia a dia contribui para uma melhoria constante, mas não é de todo fácil ou rápido. Com animais para cuidar, colheitas para regar, lenha para cortar e até rochas para minar, é fácil perderem-se com uma só tarefa e chegarem ao fim do dia com algo importante por fazer, ou pior – trabalharem até à exaustão e acordarem apenas no dia seguinte.
Se depois de tanta tarefa ainda tiverem tempo para matar, têm sempre a possibilidade de procurar um pouco de romance com uma das personagens solteiras que vivem nas diferentes povoações. Um foco de Story of Seasons são as relações pessoais e Trio of Towns não é excepção. Conversar com as personagens em quem estão interessados e dar-lhes prendas é a chave para os respetivos corações, mas é muito fácil deixar esta mecânica para trás, com tanta coisa para fazer. Um pequeno ponto que pouca influência tem no jogo em si mas que decerto irá interessar a alguns jogadores é a possibilidade de personalizar o visual da nossa personagem. No início do jogo, podem escolher o género e aspeto da vossa personagem (cor da pele, cabelo, etc.) e durante o jogo terão a possibilidade de comprar diferentes roupas e acessórios em cada uma das aldeias, de modo a tornar a vossa personagem verdadeiramente vossa. Esta componente de personalização estende-se à vossa quinta, em que todos os elementos podem ser reorganizados e mudados de sítio, havendo ainda a possibilidade de encomendar objectos e componentes para decorar a vossa quinta ao vosso gosto – sempre mediante um custo, claro.
Graficamente, Trio of Towns tem um visual colorido e personagens com design bem diferente umas das outras – ainda que as suas personalidades não acabem por brilhar muito. As três aldeias são bastante diferentes entre si e é impossível confundirem-se, com detalhes característicos e únicos, criando ambientes bem definidos. As animações são fluidas, sem falhas de performance e, para quem assim queira, podem usufruir do efeito de 3D – que ajuda a dar um ar mais cartoonesco ao jogo.
Com tantos jogos do género disponíveis, é impossível não estabelecer comparações entre títulos. Story of Seasons: Trio of Towns tem tudo aquilo que os fãs sempre quiseram e até mais, mas acaba por se perder numa complexidade que na verdade acaba por ser simples. Com muita coisa por fazer, têm aqui garantidas muitas horas de jogo, mas a beleza deste género é que essas horas são acompanhadas de uma experiência relaxante que em nada exige trinta mil explicações. Apesar dos seus soluços e da bagagem que o precede, Trio of Towns consegue ter sucesso naquilo a que se propõe: uma simulação de uma vida calma e relaxada numa quinta, acompanhados de vacas e galinhas, vivendo o dia a dia ao nosso ritmo – mesmo com vizinhança chata, que entra em casa sem ser convidada.
Opinião final:
Story of Seasons: Trio of Towns não é um jogo perfeito, nem tão pouco um sucessor à altura de Friends of Mineral Town, mas cumpre o seu propósito. É um jogo bastante competente dentro do seu género e que cumpre todos os requisitos dos fãs, proporcionando uma experiência que muitas das sequelas falharam em dar… experiência essa a que apenas conseguiram ter acesso caso consigam sobreviver aos longos tutoriais e introduções que permeiam o início do jogo.
Do que gostamos:
- Ter uma quinta na 3DS é sempre bem-vindo;
- Town Link Ranks e Farm Tips adicionam objetivos bem definidos à experiência de jogo;
- Variedade de ambientes ao introduzir três cidades tão diferentes entre si;
- Dificuldade de aprendizagem baixa…
Do que não gostamos:
- … que não justifica de todo as longas explicações;
- Progresso no jogo consegue ser um pouco lento.
Nota: 8/10