Os grandes fãs de RPG sempre sonham em ter personagens diversificados e com características únicas, algo que nem sempre é encontrado na maioria dos jogos desse estilo, que limitam o jogador a classes mais clássicas como guerreiro, mago ou ladrão. Mas onde fica um dos personagens mais importantes do RPG, o anão? É justamente isso que The Dwarves vem responder.
The Dwarves é inspirado nas obras do escritor alemão, Markus Heitz, grande autor de fantasia e que tem como inspirações a sociedade dos anões, seres de pequena estatura mas gigantesca bravura e habilidade. O jogo é totalmente inspirada na primeira obra do autor de 2003, de mesmo nome.
O jogo deu os seus primeiros passos através de uma campanha de financiamento coletivo no Kickstarter com uma meta de 260 mil dólares para o seu financiamento, e em cerca de um mês conseguiu arrecadar mais de 300 mil dólares com um total de 5,925 pessoas a contribuir e a tornar possível o seu lançamento, pelas mãos da King Art Games.
A história do jogo tem início de maneira bem clássica e a explorar todo o universo RPG na perspectiva dos anões, com um grande combate nos portões de Girdlergard, a terra dos anões onde hordas de Orcs tentam invadir e em resposta à qual o jogador tem de vestir a pele do rei dos anões, que há muito não empunhava o seu machado. Ou seja, o jogo tem início com a protecção de um reino que se encontra num grande caos com o sacrifício de monarcas, magos envolvidos em mistérios, portões selados e elfos malignos que buscam a destruição, elementos sempre presentes em histórias fantásticas.
Alguns anos se passam e o jogador irá assumir a pele de um anão chamado Tungdil na sua jornada, sem muitas explicações e com objetivos que dificilmente os jogadores vão perceber, numa visão isométrica algo que desde logo torna difícil a empatia com o personagem e com toda a sua supostamente épica jornada, mesmo quando elementos críticos da história dependem de decisões realizadas através de diálogos.
O resultado é uma história sem identidade própria, que tem um início com promessa de um conteúdo épico, mas pouco a pouco vai perdendo o seu brilho simplesmente pela falta de identificação do jogador com as personagens, o que infelizmente compromete a qualidade narrativa do jogo como um todo.
Durante a campanha do Kickstarter, uma das promessas do estúdio eram combates épicos com combates em área e hordas de inimigos para serem enfrentadas em simultâneo. The Dwarves realmente entrega esses elementos, mas infelizmente para os jogadores, o combate em vários momentos parece pouco realista.
Falar de realismo num jogo de fantasia parece até contraditório, mas não é, aquilo que torna uma história como O Senhor dos Anéis em algo de épico é o facto de os seus combates serem únicos, de cada golpe, mesmo que o mais simples, ser capaz de fazer a pessoa que está a ver sentir aquele golpe, e infelizmente isso não acontece em The Dwarves, pois além desse sentimento estar ausente, muitas vezes a própria eficácia dos golpes parece ser não existente, parecendo que o jogador está num combate intenso contra fantasmas sem uma arma mágica. Em contrapartida, nos momentos de combate em área, onde vários inimigos estão envolvidos, esse impacto já se torna mais visível, algo que infelizmente não torna o resto do combate mais dinâmico, mostrando um jogo muitas vezes cansativo.
A noção de espaço, aliado à física do jogo é um fator muito positivo e que, se bem utilizado, pode fazer toda a diferença em momentos críticos do combate, com o jogador a lutar em cima de uma muralha e ter a opção de, quando cercado por inimigos, aplicar um ataque em área e arremessar os inimigos para longe, o que provoca uma morte instantânea, mas vale lembrar que isso funciona para ambos os lados, então caso não queiram que o combate acabe rapidamente, é aconselhável que se mantenham o mais no centro possível.
Além disso, o que falta de peso nos inimigos é facilmente compensando pelos anões, que graças às suas armas e armaduras pesadas, têm uma movimentação lenta durante o combate, em que cada golpe certeiro irá fazer com que o inimigo deseje recuar.
O jogo possui suporte para comandos, e talvez, por mais surpreendente que isso seja, pode ser a melhor opção, pois embora não torne o jogo perfeito, torna-o tolerável. O jogo foi claramente desenvolvido a pensar nas consolas, com a escolha de uma jogabilidade por cliques no ecrã sem alterar o ritmo ou aceleração do personagem. Com isso o jogador irá enfrentar um tempo considerável entre o clique e o tempo de resposta para um local ou ação acontecer.
Quando se opta pelo comando, a movimentação e a escolha das habilidades se torna mais rápida e intuitiva, mesmo que por vezes possa ser um desafio considerável para quem não está acostumado a um sistema de combate ao estilo RTS (Real Time Strategy).
Fora dos combates, a movimentação do jogo é totalmente feita através de um mapa, como se fosse um RPG clássico de mesa. O jogador então terá de escolher uma direção para onde quer ir e escolher as respostas para a interação que irá ocorrer no local. Algo que vale a pena chamar à atenção, é que essas escolhas são de extrema importância e uma resposta errada pode destruir por completo toda a esperança de um jogo longo, já que é possível morrer mesmo estando no mapa, além de a todo o momento os jogadores terem de gerir os seus recursos para garantirem que são capazes de chegar ao seu objetivo sem muitos sacrifícios.
Por um lado, essa mecânica revela-se um elemento incrivelmente bem-vindo para os jogadores mais clássicos, que cresceram com jogos de mesa de fantasia como D&D (Dungeons & Dragons), porém traz ao jogo um ritmo lento que pode deixar uma sensação aos jogadores mais casuais ou mais novos de ser um jogo muito monótono, com pouca ação e combates. Os diálogos por vezes também não ajudam nessa experiência, já que pode não motivar os jogadores a ter interesse em resolver os problemas de determinado lugar.
The Dwarves possui gráficos interessantes, com efeitos, luz, sombra e iluminação bem desenvolvidos, mas a animação dos inimigos e NPCs secundários por vezes são demasiado simples, o que traz um sentimento de estar simplesmente a interagir com personagens vazios, totalmente desprovidos de emoção, seja ela alegria ou extrema raiva.
Quem busca um elemento mais clássico com certeza vai se preocupar com a banda sonora, afinal, para além da voz do mestre, muitos jogadores tinham gravado aqueles sons únicos para as suas partidas e a banda sonora de The Dwarves não dececiona, com um desenvolvimento que claramente foi detalhadamente pensado, se não fosse a própria escolha dos artistas a definição perfeita dessa dedicação. A King Art Games trouxe para esse projeto uma das bandas de metal mais épicas do mundo, a Blind Guardian.
Opinião final:
Em resumo, The Dwarves é um jogo de RPG e estratégia que vai buscar inspirações a uma grande obra alemã para criar uma experiência que em vários aspectos deixa a desejar e fica abaixo daquilo que havia sido prometido na sua campanha no Kickstarter, trazendo combates que nem sempre refletem a emoção do momento, com um sistema de combate que com certeza não irá agradar à maioria dos jogadores e uma história claramente incrível, mas que se perde na maneira como é contada.
The Dwarves não é de maneira nenhuma um mau jogo, na verdade é um jogo dececionante, mas mesmo assim existem muitos elementos de grande qualidade, a começar pela própria escolha da raça à qual os jogadores pertence, que foge por completo à escolha da maioria dos jogos do gênero, e que com certeza agrada a uma grande quantidade de jogadores. O problema é que o jogo sofre pelas escolhas de como foram implementados estes elementos, como por exemplo a simples opção de escolher um sistema de combate por turnos iria tornar um dos maiores pontos fracos do jogo, naquilo que de melhor ele teria.
Do que gostamos:
- Gráficos interessantes;
- Banda sonora é um dos pontos mais positivos do jogo;
- Tradução para PT-BR feita na perfeição.
Do que não gostamos:
- História sem identidade própria;
- Problemas com os comandos ao se utilizar rato e teclado;
- IA dos inimigos deixa a desejar;
- Escolha de movimentação pelo mapa pode ser muito selectiva a nível de público.
Nota: 6/10