Embora não seja o maior fã de jogos em mundo aberto, qualquer survival-horror com um plano de fundo pós-apocalíptico, seja um vírus que consuma tudo, intervenção divina ou colapso social, sou o primeiro a alinhar. Por muito que o género possa estar banalizado, uma boa adaptação é sempre bem-vinda. Nesta narrativa, os zombies são designados por Freakers.
Atirei me para a aventura com uma mistura de excitação e cautela, e felizmente encontrei uma experiência de drama de sobrevivência com zombies de elevada qualidade – apenas um pouco atordoada pelos bugs e pequenas quedas de framerate que felizmente já estão maioritariamente resolvidas pelo conjunto agressivo de atualizações que o jogo recebeu na semana de lançamento.
Days Gone coloca-nos na cabeça de Deacon St. John, um arruaceiro que virou caçador de recompensas e que está apenas a tentar sobreviver no “deserto” do noroeste da América, dois anos após uma epidemia global. O dilema do nosso personagem gira em volta de Sarah, que foi evacuada pela Organização Nacional de Resposta a Emergências (NERO) e está supostamente morta. Para trás, fica Deacon com o seu melhor amigo, Boozer, e é então que começa definitivamente a nossa aventura.
O cenário é típico de qualquer jogo pós-apocalíptico com milhões de hordas em movimento, inundando o país e infectando os sobreviventes, que permanecem com agilidade assustadora. No fase inicial da trama, Deacon investiga uma pista sobre a NERO que sugere que Sarah ainda está viva, concedendo-lhe um novo propósito além da sua jornada aparentemente sem destino traçado. Isso ajuda a dar vida à fórmula da jogabilidade central, que será familiar para qualquer fã de títulos cinematográficos em mundo aberto, algo que se iniciou com Horizon: Zero Dawn a nível de títulos exclusivos Sony.
A premissa principal do jogo passa por andarmos a vaguear de motociclo por Oregon para ganhar recompensas, assim como completar um grande número de missões que prolongam a narrativa (descobrir o que aconteceu com Sarah, ajudar o Boozer), que consistem simplesmente em tarefas paralelas (limpar os imensos ninhos de Freakers, invadir os acampamentos NERO) e constantes procuras por materiais como sucata e também gasolina para abastecer a nossa melhor amiga. Enquanto estiveres a vaguear pelo mundo, é preciso teres cuidado com os números exagerados de Freakers que podem aparecer, isto para garantir que não és invadido por uma horda viajante, que pode numerar centenas de inimigos fortes, mas também humanos, como os Rippers e os Cults.
Deacon tem uma variedade de armas de longo alcance e combate corpo-a-corpo para atacar as ameaças aberta ou furtivamente, e é também possível criar ferramentas como coquetéis molotov, bombas de produção de ruídos, entre outras para escapar em situações que exijam mais criatividade. A cada morte e sucesso de missão é sempre atribuída uma recompensa de XP, que pode ser gasta num conjunto abrangente de habilidades com o intuito de tornar a experiência mais imersiva.
É justo dizer que Days Gone causa uma primeira impressão bastante peculiar. A premissa, embora atraente para qualquer grande aficionado por zombies, leva algum tempo para dar sentido óbvio à sua narrativa, sendo um pouco secante nos momentos iniciais. Diálogos vazios, transições entre cenas e jogabilidade fazem com que pareça que houve cortes cirúrgicos que levam à ausência de decisões que afetem a narrativa, sendo que em certos momentos estes problemas são perceptíveis e provocam uma ligeira irritação.
No entanto, após as primeiras cinco horas, Days Gone torna-se numa experiência mais rica. A jogabilidade apresenta apropriadamente a mecânica central, e os combates vão se tornando progressivamente mais desafiantes. Muito gira em torno das hordas de Freakers. A natureza dinâmica dos encontros com os Freakers é muito viciante, até mesmo separada do design da missão que te leva até eles. A exploração geral em si é gratificante graças aos ambientes bem desenhados e variados; o ambiente selvagem do Oregon definitivamente é uma ótima tela para o tipo de pintura que é Days Gone.
As missões principais de Days Gone são divertidas de jogar e encontram-se aliadas a um ótimo desempenho de guião. À medida que o jogo se desenrola, Deacon entra em contacto com vários acampamentos de sobreviventes e ajuda os seus líderes a completar variadas tarefas. Estas vão desde limpar acampamentos de bandidos até salvar membros do respetivo acampamento, tudo para conquistar a confiança da comunidade, assim como ganhar materiais para posteriormente comprar atualizações que ajudam o desenvolvimento da mota, assim como do próprio personagem com a inserção, de por exemplo, novas armas. Há repetições desnecessárias, e muitos bugs estranhos, como transições de texturas que atrapalham o fluxo geral, mas quando estás no controlo e ao redor de Freakers a tentar sobreviver, é fácil esquecer estes problemas. A abordagem narrativa das relações Deacon/Sarah e Deacon/Boozer vai se tornando mais interessante ao logo do tempo que gastas neste título. Dando-lhe um desenvolvimento lento, contudo maduro. As missões que nos são propostas pelos personagens de acampamentos ajudam a que a imersão seja um íman bem mais forte para os fãs de mundos bem construídos e fiéis aos seus princípios.
O tiroteio mais lento e as inúmeras abordagens para combater os Freakers são das melhores partes que Days Gone tem para oferecer, embora um pouco manchada no entanto por uma inteligência artificial redutora que despromove a qualidade de tudo o resto. Não que esta seja horrível, mas é sem dúvida um dos calcanhares de Aquiles da nova IP da Sony.
Muitas das habilidades, divididas entre o corpo-a-corpo, longo alcance e sobrevivência, também parecem demasiado alargadas para as reais necessidades do jogo. Por outro lado, a possibilidade de usarmos os materiais que recolhemos para a personalização e cuidado das nossas próprias armas é um fator muito positivo e dinâmico do jogo. Rapidamente nos habituamos a ele e também a gerirmos de forma mais racional os nossos recursos.
É inevitável não dedicarmos um pedaçinho de texto à nossa mota, assim como a falar da sensação de a conduzir. À imagem do que é Days Gone, a nossa mota também tem bastantes elementos de personalização, que se vão debrochando naturalmente no decorrer da narrativa. É também de extrema importância estarmos atentos ao estado mecânico da mota, assim como ao seu depósito, porque a gasolina não se põe sozinha e tudo o que não queres é ficar sem uma ignição competente durante um apocalipse zombie. A condução é muito gratificante, ou pelo menos foi esta a minha impressão e opinião. No início pode-se estranhar um pouco o peso da mota, a sua mecânica e físicas, mas rapidamente se percebe que é uma experiência de condução bastante positiva e singular, tendo a sua própria jogabilidade e identidade.
O trabalho visual promovido pela Bend Studio está deveras impressionante. O ciclo dia e noite de Days Gone é impressionante e consegue impactar-nos muito facilmente com a qualidade dos seus cenários e texturas. A qualidade das animações e modelos de personagens também é bastante elevada, embora algumas destas sofram de algumas pequenas falhas de detalhe relativamente ao nosso personagem. Não estando tão caprichado comparativamente com outros exclusivos Sony, não deixa de estar impecável no quesito visual.
O som também está muito bem trabalhado e feito de maneira a promover o pânico e a imersão de viver neste mundo nefasto. A qualidade da sonoplastia vai da natureza à própria essência dos zombies que nos transmite de forma muito agradável o que está a acontecer nas perigosas estradas de Oregon. Por falar em som, a banda sonora também é impressionantemente boa com um tema principal de primeira linha. Rapidamente ficamos com as músicas na cabeça e as associamos de imediato a Days Gone. Mais uma prova do bom trabalho realizado nesta nova IP.
Opinião Final:
Days Gone é um jogo que foi atirado cá para fora com algum trabalho de casa por fazer, e isso notou-se nas críticas iniciais ao título da Sony. Porém, as atualizações ajudaram a perceber que o talento e a qualidade estão lá! Days Gone apresenta-se como um jogo de forte e longa narrativa, com um gameplay diversificado que propõe novas abordagens ao estilo mundo aberto mesmo sem revolucionar o género.
À medida que o vamos jogando, vamos percebendo melhor tanto as personagens, como as suas motivações, o mundo que nos rodeia e, se lhe dermos o tempo necessário, isso vai acontecer de forma natural. Além de tudo isto, os visuais do jogo são de tirar o fôlego em determinados momentos, o que é louvável para um estúdio de dimensões médias como é o caso do Bend Studio.
Em suma, este é um jogo que apresenta problemas mas que os consegue resolver de forma vitoriosa e que merece sem qualquer dúvida um lugar de destaque nesta geração de consolas.
Do que gostamos:
- Jobabilidade viciante;
- Enredo forte e bem estruturado;
- Várias opções de progressão;
- Hordas.
Do que não gostamos:
- Início atribulado;
- Pequenos problemas de performance;
- Mundo algo repetitivo;
- Inteligência Artificial.
Nota: 8/10