This War of Mine: Stories – The Last Broadcast – Análise

This War of Mine foi lançado originalmente para PC em novembro de 2014, pelas mãos da 11Bit Studios, sendo um jogo de sobrevivência e exploração num ambiente de guerra, inspirado no Cerco de Sarajevo, durante a Guerra da Bósnia que perdurou de 1992 a 1996 e que resultou, de acordo com as últimas pesquisas, em quase 100 mil mortos.

Porém, o grande diferencial do jogo em comparação com outros jogos com uma temática de guerra, é que This War of Mine não foi desenvolvido para mostrar o quão incrível podem ser os militares e as suas tecnologias bélicas, mas sim para colocar o jogador na pele de civis que precisam de sobreviver num ambiente de grande hostilidade, incertezas, doenças e limitações no acesso a recursos básicos de sobrevivência.

O jogo sempre teve como foco trazer justamente essa visão humana dos acontecimentos e mostrar que numa guerra não há momentos de glória para quem está numa cidade constantemente devastada e onde as pessoas precisam de ir até o limite para sobreviver. E, passados 3 anos desde o seu lançamento, o estúdio anunciou uma grande novidade: o jogo iria receber três histórias paralelas ao longo dos meses seguintes, histórias essas que iriam explorar as vivências de outras personagens e as suas individualidades dentro deste ambiente hostil, e é justamente aí que chegamos a Stories: The Last Broadcast, o segundo capítulo desta nova série.

Ao contrário do jogo original, onde tínhamos um grupo de sobreviventes que precisavam de se unir para sobreviver, e onde o jogador tinha uma maior liberdade de ações e divisões de tarefas, The Last Broadcast, coloca o jogador numa situação ainda mais tensa, já que iremos acompanhar a história de Malik, um locutor de rádio, e a sua esposa Esma. Ambos estão refugiados numa torre de rádio, local onde a maior parte da história se irá desenrolar. Porém, o reduzido número de sobreviventes não é o único obstáculo, já que Malik possui uma incapacidade que limita drasticamente os seus movimentos, levando a que recaia assim em Esma todo o peso da maior parte das ações, pelo que será ela a responsável por procurar recursos quando a noite cai, preparar as refeições para ambos, proteger a torre de rádio ou criar ferramentas e objetos essenciais para a casa.

Já Malik, devido a essa incapacidade, está limitado a um único piso, onde ele está principalmente responsável pela transmissão de rádio, que dá nome à história. Malik pode procurar sinais de rádio para obter informações ou ser uma das principais vozes da resistência ao informar os outros sobreviventes dos últimos acontecimentos. Quem jogou o jogo original, com certeza irá lembrar-se das transmissões de rádio, e agora em The Last Broadcast, vemos e controlamos um dos responsáveis por essas transmissões.

E esta é justamente a grande dificuldade deste segundo capitulo da série Stories, já que o jogador irá sentir-se constantemente desafiado a gerir todas as tarefas na pele de Esma, afinal estamos a lidar com um ser humano que precisa de descanso e de satisfazer as demais necessidades básicas, mas que ao mesmo tempo é também responsável durante a noite por procurar recursos ou vigiar a torre, e durante o dia por atender às necessidades daquele local e do seu marido, que infelizmente não tem outra escolha  a não ser limitar-se às transmissões. Estes encargos colocados todos nos ombros de uma só personagem tem como consequência que cada ação tenha um peso ainda maior, já que um simples ferimento não apenas poderá comprometer a sobrevivência de Esma, como também do seu marido. Vale ainda chamar à atenção para o facto de que o relógio será sempre um inimigo, seja por reduzir a quantidade de tarefas que se podem realizar ao longo do dia, ou reduzir o tempo de busca por recursos durante a noite.

Um dos elementos únicos desta história criada em parceria com a escritora Meg Jayanth (80 Days) é que o jogador poderá conseguir informações que poderão ser transmitidas através do rádio. Esma poderá obter essas informações durante a exploração em busca de recursos, através de algo que ela veja ou vivencie, ou através de algo que outros sobreviventes lhe contem. Porém, nem sempre será a melhor opção transmitir essas informações para os sobreviventes na cidade, já que os sobreviventes vão reagir a essas notícias e nem todos vão reagir de uma maneira positiva e favorável ao casal, sendo mesmo possível que a vossa jornada de sobrevivência tenha um final muito breve como resultado de certas mensagens. Dependendo dessas ações, é possível chegar a vários finais diferentes, e muitas vezes com pequenas, mas importantes, mudanças para os protagonistas.

Como já referido, Malik está mais limitado nas suas ações, enquanto que Esma poderá explorar diferentes locais do mapa quando a noite cai e é aí que outros elementos começam a ser explorados nessa jornada. O primeiro deles (e já presente no jogo original) é de que o jogador deverá escolher o local que deseja visitar com base naquilo de que precisa e no risco que deseja correr, ou seja, alguns locais oferecem menos riscos, porém, também não possuem tantos recursos ou recursos essenciais como comida, água limpa ou combustível, enquanto que locais com abundância de recursos poderão estar fortemente protegidos por civis ou militares. Outro elemento, que já estava presente no jogo original e que em The Last Broadcast ganha um peso ainda maior, é de até onde o jogador está disposto a ir para sobreviver e os efeitos das ações que toma para esse fim. Muitas vezes iremos encontrar sobreviventes que vão pedir a nossa ajuda ou recursos para sobreviver e fica nas mãos do jogador escolher ajudá-los, ignorar, ou, em algumas situações, roubar-lhes o pouco que possuem, muitas vezes recorrendo até a uma abordagem letal.

Estes momentos de tensão trarão consequências mesmo ao nível da estabilidade psicológica de Esma e fará o jogador questionar-se constantemente sobre até onde está disposto a ir para não apenas proteger Esma, mas também para manter o casal vivo. Esta dualidade de escolhas e consequências em The Last Broadcast, como já foi mencionado, também se estende às informações que se podem divulgar. Dando um exemplo concreto, durante uma missão de coleta, Esma descobre que alguém está a disparar de uma posição estratégica contra os civis que arriscam atravessar uma área, ela então poderá ser confrontada com uma situação onde pode ajudar um civil ferido, porém, ao se colocar uma situação onde ela própria poderá ser atingida pelos disparos, morrer e consequentemente deixar o seu marido a morrer à fome sozinho. Como alternativa, pode deixar aquele civil morrer e carregar consigo a culpa por meses. Contudo, ao regressar à torre de rádio, ela poderá reduzir o peso na sua consciência ao informar Malik sobre o atirador, sendo esta informação divulgada e frustrando os planos desse atirador, e assim deixando o local mais seguro. Esta divulgação pode, contudo, fazer com que as atenções do atirador se voltem agora para o casal.

Visualmente, o jogo mantém as características já definidas em This War of Mine, com um cenário rico em detalhes e profundidade, mas ainda assim com um aspeto gráfico próprio, como se tivesse saído de uma graphic novel em formato 3D. Com esta forma de apresentação teremos cenários predominantemente urbanos e devastados, mas sempre ricos em detalhes e, de maneira até surpreendentemente em alguns momentos, com alguma beleza em meio de todo o caos.

Felizmente, ao contrário do jogo original, em The Last Broadcast, Malik e Esma têm inicialmente alguns recursos e ferramentas na torre de rádio, sendo possível começar a aventura com algumas comodidades, que no jogo original demoravam e exigiam um pouco mais de tempo e exploração dos jogadores para serem obtidas. Ainda assim, o local irá apresentar alguns desafios ao casal, sendo um dos principais  um desmoronamento que impede Esma de ter acesso a uma horta com ervas que ela poderia utilizar para produzir medicamentos, por exemplo. E quem jogou This War of Mine sabe bem como os medicamentos são importantes quando menos esperamos.

Esta escassez de recursos e até as transmissões feitas por Malik, trazem ao jogo um outro elemento já presente no jogo original e que em The Last Broadcast foi ampliado: a interação com os sobreviventes na própria torre de rádio. Em alguns momentos, Esma será confrontada com sobreviventes à porta do local, muitas vezes apenas à procura de recursos, algumas vezes num ato de troca, outras apenas num pedido desesperado para também salvar a família, e outras ainda em que haverá aqueles que, por diversos motivos, não batem à porta com boas intenções, e, mais uma vez, o jogador será confrontado com dilemas morais e escolhas que vão trazer algumas consequências. Os visitantes podem ir desde um homem que precisa de alimentos para salvar os filhos, a alguém que apenas fingiu precisar de recursos para que a porta fosse aberta, e a partir daí tudo pode acontecer.

Em relação ao áudio e efeitos sonoros, o jogo também mantém o seu destaque com os efeitos sonoros a criarem toda uma atmosfera pesada que imerge o jogador. Com isso, o jogador irá constantemente sentir-se dentro desse ambiente de guerra, com o som das bombas a caírem, pessoas a gritarem por ajuda, armas a serem disparadas, nas proximidades ou à distância, e até mesmo sons das munições a embaterem com algo na sua trajetória, seja um objeto do cenário ou um ser humano.

Algo a destacar é que tivemos acesso ao jogo antes do lançamento, e nesta versão todos os textos já presentes no jogo original estavam perfeitamente traduzidos para PT-BR, mas, grande parte do conteúdo em formato de texto desta nova DLC estava em inglês. É muito provável, assim, que nas primeiras horas do seu lançamento o jogo ainda tenha alguns elementos não traduzidos ou com erros de tradução, porém a 11bit Studios é conhecida dar bastante atenção à sua comunidade de fãs e o jogo deverá receber alguns patches de correção caso tal aconteça.

Opinião Final:

Em resumo, This War of Mine: Stories – The Last Broadcast é um excelente DLC que reúne tudo aquilo que tornou This War of Mine num dos mais aclamados jogos independentes dos últimos anos, ampliando o alcance e a intensidade de alguns dos seus elementos trazendo toda uma atmosfera pesada aliada a uma narrativa extremamente emocional, opressiva e sombria que vos irá levar a mergulharem de cabeça nesta história. História em que podem sentir todo o peso de um homem que dedica as suas horas a informar os sobreviventes dos últimos acontecimentos, e de uma mulher que fará tudo para sobreviver e, principalmente, proteger o seu marido, mesmo que isso custe a sua própria vida e sanidade.

Se procuram um jogo de sobrevivência que explora o lado negro e sem glórias e medalhas de uma guerra, This War of Mine é o jogo ideal e The Last Broadcast irá sem dúvida merecer a vossa atenção, com a sua narrativa com múltiplos finais e que não deixará ninguém indiferente. This War of Mine: Stories – The Last Broadcast ficou exatamente hoje, Quarta-feira dia 14 de novembro, disponível para PC e o terceiro capítulo da série Stories tem previsão de lançamento para 2019.

Do que gostamos:

  • Uma narrativa extremamente bem construída em parceria com Meg Jayanth;
  • O ampliar de elementos já presentes no jogo original;
  • A dualidade das ações e consequências que podem gerar múltiplos finais;
  • Ambientação sombria e opressiva que favorece a imersão do jogador nesse universo e situações de vida;
  • Personagens e motivações com as quais o jogador facilmente poderá identificar-se;
  • Inspiração em elementos históricos e eventos reais.

Do que não gostamos: 

  • Tradução parcial para PT-BR (algo que deverá ser corrigido pós-lançamento);
  • Segue uma base já conhecida dos jogos independentes de ser muito direcionado para um público específico, o que pode limitar o seu interesse por quem procura algo diferente dentro da temática de guerra e conflitos armados.

Nota: 9,5/10

Jogo analisado através de uma cópia gentilmente cedida pela 11bit Studios para PC.