Em pleno século XXI, os videojogos estabeleceram-se como um meio de entretenimento a ter em conta, tornando-se a cada geração mais popular, mas com a popularidade vem também um maior ódio por parte de pessoas que estão bem posicionadas na vida para dar a conhecer a sua voz e consequentemente as suas críticas. Não é a primeira vez, nem será a última, que os jogos são acusados de vários males do mundo; acusados de serem uma coisa que não são, sendo que assim de repente me lembro de toda a polémica que o Quintino Aires causou quando foi a um programa da TVI difamar os jogos, acusando-os de ser uma droga.
E tocando neste exacto ponto, porque é que ainda dizem que os jogos são uma droga? Talvez por uma pessoa gostar e jogar diariamente ou quase, não sendo algo que se faz de um a um ano, por exemplo. Mas uma afirmação como aquelas, não poderia estar mais errada. Uma mulher quer ver todos os dias a sua novela, um homem quer ver todos os dias a sua série ou algum programa relacionado com futebol, uma pessoa quer ouvir diariamente as suas músicas favoritas…e muitos outros exemplos poderiam ser dados. Isso não se chama droga, chama-se entretenimento. Chama-se uma pessoa sair da escola ou do trabalho e querer divertir-se, fazendo aquilo que gosta.
Relembrando outras coisas que o Quintino Aires disse: “A PlayStation é veneno, não ajuda à criatividade, não desenvolve a relação, não faz bem absolutamente a nada, faz doença mental, fazem as pessoas ficarem frias, secas, incapazes de relacionar com os outros. Compramos uma PlayStation para jogarmos 10 minutos na vida e depois deitá-la fora?”. Claro que isso é algo dito por uma pessoa que obviamente odeia videojogos e que, tendo o privilégio de opinar sobre as coisas na televisão para todos verem e ouvirem, diz o que lhe apetece ignorando os factos e demonstrando respetivamente o seu desconhecimento sobre o assunto e sobre a realidade da indústria de videojogos e os seus benefícios cientificamente comprovados.
Primeiro de tudo o senhor Quintino Aires só tinha conhecimento da existência da PlayStation, no entanto também há a Xbox e as consolas da Nintendo. Além disso também se pode jogar num PC e em smartphones. Segundo, veneno mata e os jogos não. Terceiro, jogos como Minecraft, LittleBigPlanet, Super Mario Maker e jogos da WWE, por exemplo, oferecem ferramentas para se criar uma infinidade de coisas, algo que abre portanto um mundo de possibilidade, e isso puxa obviamente pela criatividade do jogador. Quarto, e no que toca a relacionar-se com outros, longe estão os dias onde não tínhamos acesso à internet e não podíamos falar com outras pessoas através da mesma. É possível jogar online com os amigos e falar com eles, tal como é possível um amigo estar ao nosso lado e fazermos umas partidas. De uma forma ou de outra, estamos a comunicar com aquela(s) pessoa(s), estamos a divertir-nos juntos, a rir, e essa realidade é exactamente o oposto daquilo que o Quintino Aires implicou.
Em relação aos videojogos não fazerem bem a nada e fazer doença mental, mais uma vez foi uma afirmação triste, que demonstra a raiva que o senhor Quintino Aires tem aos videojogos, não tendo conhecimento científico sobre o assunto, esse sim que prova exactamente o contrário. De acordo com o Instituto de Psiquiatria, Psicologia e Neurociência do King’s College de Londres e a BBC “Bang Goes the Theory”, os jogos requerem um exercício de mente e são uma mais-valia para os idosos, uma vez que deixam as mentes mais capazes para a resolução de problemas do quotidiano. O jornal Psychological Reserach também divulgou um relatório a referir que os jogos do género FPS melhoram capacidades de percepção mental, tal como a Proceedings of the National Academy of Science relatou que os jogos de ação são benéficos para o cérebro, melhorando substancialmente a performance em tarefas que exigem atenção e percepção.
Por fim, compramos uma PlayStation para jogarmos 10 minutos na vida e depois deitá-la fora? Essa foi a pergunta que o Quintino Aires fez. Agora vou pôr a pergunta de outras formas. Compramos uma TV para ver 10 minutos na vida e depois deita-se fora? Compramos um carro para conduzi-lo durante 10 minutos na vida e depois deita-se fora? Compramos um bilhete de cinema para ver o filme 10 minutos e depois deita-se fora? Compramos um PC para usá-lo 10 minutos e depois deita-se fora? Compramos um livro para ler durante 10 minutos e depois deita-se fora? Podia continuar com as perguntas, mas acho que já dá para perceber onde quero chegar. E onde quero chegar é quando uma pessoa compra algo, é para fazer uso, e não há qualquer mal nisso, bem pelo contrário.
Mas este não é um artigo sobre o Quintino Aires, é sobre os videojogos serem acusados de coisas sem nexo. Esse senhor é uma das figuras mais conhecidas de Portugal que denegriu os videojogos, dai ser mencionado, mas há outras pessoas que tem a mesma mentalidade e que por outras palavras dizem o mesmo, pelo que isto não é apenas uma resposta directa, mas também universal sobre os assuntos em questão. Poderia também apresentar muito mais estudos sobre os benefícios dos jogos, no entanto há inúmeros deles, e numa rápida pesquisa na internet é fácil encontra-los, o que é ainda mais surpreendente haver pessoas a acusarem os videojogos de serem prejudiciais, pois já está à vista de todos que não é.
No entanto o que me motivou a escrever este artigo foi devido a um massacre numa escola na Flórida, onde o ex-aluno Nikolas Cruz pegou numa arma de fogo e começou aos tiros, matando 17 pessoas no total. A pergunta que deve estar na vossa mente é: mas o que é que isso tem a haver com jogos? É deveras uma boa pergunta. A questão é que Matt Bevin, governador no estado do Kentucky considerou os videojogos culpados desse acontecimento. Disse que os jogos são lixo, que estão listados para uma audiência adulta mas que as crianças os jogam e que os jogos motivam a violência, apontando também o dedo a outros meios de entretenimento como a música, séries televisivas e filmes.
Vamos a esclarecimentos. Violência é algo que existe desde os dias primórdios, ou seja, desde sempre, muitos antes de haver qualquer meio de entretenimento de hoje em dia como videojogos, filmes e música. Não há maior violência do que houve com a Guerra Mundial, e nessa altura os jogos não existiam. O grande erro nisto tudo é não se reconhecer o real problema e acusar outras coisas que não tem culpa nenhuma só porque é mais fácil fazer isso do que enfrentar os verdadeiros problemas de frente. Os jogos são lançados em todo o mundo, não apenas nos EUA, no entanto só se houve casos de tiroteios nas escolas num País: os Estados Unidos da América. Porque será? A resposta não podia ser mais simples. A facilidade com que as pessoas tem acesso a armas de fogo é enorme, de tal forma que qualquer pessoa pode comprar uma. Nos EUA, todas as casas tem pelo menos uma arma de fogo, e são vários os casos em que crianças pegam numa arma como se fosse um brinquedo e matam-se a elas próprias ou matam outras pessoas. Lembro-me de ler um caso em que uma criança de 2 anos se matou com a arma da sua avó e que nesse mesmo ano ocorreram 202 casos similares.
Portanto o problema reside ai, na facilidade a que se tem acesso a armas de fogo e nada ser feito para mudar esse facto. Os adolescentes ou aqueles que entram já na sua fase adulta, passam por várias mudanças e é uma fase complicada, e o governo devia preocupar-se em apostar nas escolas de forma a serem dados aconselhamentos a esses jovens e ajudá-los. Nos EUA já são muitos os casos em que alunos entram na escola armados e começam aos tiros, matando pessoas. Muitas das vezes trata-se de jovens com problemas pessoais, jovens que sofrem de bullying e se querem vingar, jovens que não conseguem aguentar a pressão que as próprias escolas fazem com a quantidade de trabalhos e testes, daí essa ajuda por parte das escolas serem necessárias e fundamentais. No entanto, e mais uma vez, isso nada tem a haver com os videojogos ou qualquer outro meio de entretenimento.
Só há uma coisa que Matt Bevin está correcto, que é o facto das crianças jogarem jogos que só deviam ser jogados por adultos. No entanto as consolas tem controlo parental, o que significa que os pais tem a responsabilidade de controlar o que os seus filhos jogam. As lojas físicas também não deviam permitir que jogos aconselhados para adultos fossem vendidos a menores, a não ser que tivesse permissão de um familiar presente. Com isso dito, qualquer pessoa, até mesmo uma criança, tem noção que jogos, filmes e outros meios de entretenimento são isso mesmo, um entretenimento, e não passa disso. Quando era criança também jogava alguns jogos violentos e via animes que eram tudo menos pacíficos, como Dragon Ball, e não ando ai a matar pessoas. E tal como eu, há outros milhões e milhões de pessoas.
Depois do tal tiroteio na escola da Flórida, um representante de Estado dos EUA sugeriu um imposto nos jogos violentos e que as receitas seriam usadas para programas de aconselhamento e de saúde mental. O problema mais uma vez reside em acusarem os videojogos dessa tragédia e ignorar o óbvio, que mais uma vez referimos: a facilidade com que qualquer pessoa tem acesso a armas nesse País. No entanto esse tipo de programas são muito bem-vindos e iriam ajudar, no entanto as pessoas ligadas à indústria de videojogos não tem que levar com uma taxa de 10% porque esta é uma situação completamente alheia a jogos; algo que nada tem a haver com esse meio de entretenimento.
Donald Trump, o homem das polémicas, e só por acaso o Presidente dos EUA, também chamou a atenção para a violência nos videojogos, referindo que isso está a moldar os pensamentos dos jovens, querendo mais uma vez associar os jogos a casos com armas de fogo. Claro que estamos a falar da pessoa que já chegou a admitir que a National Rifle Association, instituição que reúne fabricantes de armas, foi fundamental para que ele se elegesse, apoiando intensamente a sua campanha. Depois de se tornar presidente, Donald Trump levantou a proibição de venda de armas a indivíduos com instabilidade mental, algo que tinha sido implementado por Barack Obama. De acordo com o Serviço de Pesquisa do Congresso, o número de armas nos EUA é maior que a população, estimada em 323.1 milhões de pessoas. Há mais de 50 mil lojas de armas regulamentadas nos EUA. Segundo a Campanha Brady, um centro de prevenção de violência, referiu que morrem 33.000 pessoas anualmente por disparos de armas de fogo, sendo que a média de mortes por dia é de 93 pessoas. No entanto os videojogos é que são os culpados das tragédias com armas de fogo? É óbvio que não. Os videojogos só são o alvo ideal para acusações dessas porque simplesmente é muito mais fácil acusar um meio de entretenimento do que implementar medidas para dificultar o acesso a armas. Porque dificultar/limitar o acesso a armas iria diminuir bastante um dos maiores lucros que os EUA tem, além de que o Donald Trump teria que ir contra uma instituição de armas que o ajudou a eleger-se como Presidente. Ou seja, não irá acontecer, e como não irá acontecer, tem que culpar outras coisas, ou seja, os videojogos.
Esse tipo de pessoas que decidem ignorar os factos e os verdadeiros problemas e culpar os videojogos que não tem absolutamente culpa nenhuma, deviam pensar bem nas coisas antes de abrir a boca e respeitar uma indústria que merece respeito. Os jogos não se criam sozinhos, há milhares de pessoas que fazem disso o seu ganha-pão e tem o nobre objectivo de divertir as pessoas que decidem comprar o seu jogo. E as pessoas compram videojogos para jogar e se divertir nos seus tempos livres, depois da escola ou do trabalho. Portanto pergunto: o que há de mal nisso? O que é que isso tem a haver com droga ou tragédias com armas de fogo? A resposta é: nada. Infelizmente haverá sempre pessoas que irão continuar a olhar numa só direção tendo os videojogos como alvo em vez de analisar e tentar resolver os verdadeiros problemas, e não há nada que se possa fazer, mas nesses casos é sempre bom os jogadores se juntarem e darem do seu parecer, apresentando os seus argumentos com respeito e se possível com provas.
Aos nossos leitores e jogadores de todo o mundo, desejamos que apreciem os jogos como eles são e que se divirtam, pois esse é o propósito de um jogo e é a razão de nós jogadores apostarmos neste meio de entretenimento. Estas acusações infundadas aos videojogos só servem para nos unir ainda mais e para dar a conhecer às pessoas que tem como alvo esta indústria o quão erradas estão.