Análise – Life is Strange: Before the Storm (PC)

Em 2015, a Dontnod Entertainment, equipa responsável por Remember Me, brindou-nos com um excelente jogo por episódios com foco na narrativa: Life is Strange. Desde o final da jornada em que o jogo nos levou, muitos jogadores têm esperado por mais da série e impacientemente continuam a espera pelo segundo jogo, que já se sabe estar a ser produzido. Enquanto isso, a Deck Nine lançou o ano passado Life is Strange: Before the Storm, um jogo mais curto, de três episódios, que serve de prequela aos eventos de Life is Strange. Mais especificamente, este jogo foca-se no começo da relação de Rachel Amber e de Chloe, ambas personagens essenciais no primeiro jogo.

Escrever uma análise a um título que se foca tanto na narrativa como os jogos desta série é uma tarefa difícil, porque obriga a não entrar em grandes detalhes, sob pena de estragar a experiência a eventuais interessados. Por isso, sobre a história em si, para além do que foi dito, não irei comentar mais, a não ser de um modo muito geral sobre o que achei do enredo. Ao invés disso, e uma vez que este jogo se mantém tão próximo do primeiro Life is Strange, o meu principal ponto de análise vai passar por uma comparação entre este jogo e o da Dontnod. A grande questão será então de se a Deck Nine conseguiu manter o feeling do jogo original, se Before the Storm merece ter “Life is Strange” no seu título.

Neste sentido, o aspeto que mais salta à vista é que o controlo da ação permanece exatamente o mesmo. Controlamos a nossa personagem (desta vez Chloe e não Max) e vamos ora interagindo com o meio, ora falando com as personagens e, no decorrer destas ações, tomando várias decisões que afetarão a experiência posterior. Before the Storm, contudo, apresenta uma diferença em relação ao original que, coerentemente não podia deixar de ter: não é possível voltar atrás no tempo. Sem dar grandes spoilers, quem já sabe um mínimo que seja sobre Life is Strange, sabe que Max ganhou o poder de viajar para trás no tempo (embora não indefinidamente, mas sim num período limitado), capacidade essa que Chloe não tem. Em substituição desta capacidade, Chloe apresenta-se – também em coerência com o primeiro jogo – como uma adolescente de personalidade bastante forte e muitas vezes sem papas na língua. Isto confere-lhe a habilidade de superar situações indesejáveis através de uma capacidade argumentativa que se baseia bastante em conseguir bons comebacks para o que foi dito e não tanto uma resposta lógica. A sabedoria de Chloe é muito mais uma sabedoria prática de como saber liderar uma interação. Não esperem que ela seja um Sócrates (o filósofo, não o ex-primeiro ministro).

No jogo, esta habilidade reflete-se em momentos específicos em que se tem de vencer uma discussão com alguém. Embora interessante e sem dúvida adequada à personalidade de Chloe, há que confessar que estes momentos não se sentem tão bem adequados e naturais como eram os momentos de viagem no tempo de Max. Para além disso, este próprio elemento não é tão estimulante e passa mais por um recolher de pistas sobre o que dizer anterior à própria interação, tornando o jogo mais linear nestes aspetos.

Chloe está de costas voltas com o mundo, e não tem problemas em mostrá-lo.

Devido a eventos que não irão ser detalhados, Chloe representa tanto neste jogo como no primeiro Life is Strange o paradigma de adolescente perdida e revoltada com o mundo. Por isso, desta vez estaremos muitas vezes perante opções mais niilistas ou rebeldes e despreocupadas, que não encontrávamos na jornada de Max. Isto significa também que a própria ambiência do jogo muda bastante e por isso encontramos várias vezes ambientes mais perigosos e situações de comportamentos de risco, o que vai plenamente de encontro à imagem com que ficámos de Chloe. Alguns diálogos, movimentos/animações e situações parecem, no entanto, um pouco forçadas ou pouco naturais, algo que pontualmente também afetava Life is Strange. Estes, contudo, não são muito notórios e facilmente passam despercebidos, para além de que não são recorrentes.

Outra diferença engraçada que se faz notar é que, não sendo Chloe uma estudante de um curso de fotografia (ao contrário de Max), aqui os colecionáveis não passam por ela tirar fotografias a eventos mais notáveis com que se vai deparando. Em vez disso, vai descobrindo sítios propícios a serem agraciados com um belo graffiti, ficando a nosso cargo escolher de entre duas opções qual a que queremos que Chloe desenhe. Esta possibilidade de escolha torna a experiência mais variada (até porque não podemos voltar atrás no tempo), para além de que mais uma vez demonstra uma boa adaptação de elementos de Life is Strange para este jogo.

Quanto a tudo o que diz respeito aos efeitos sonoros, Before the Storm está bastante apresentável e muito bem polido. Os sons dos passos, da natureza, de veículos em movimento, etc. estão irrepreensíveis. Também a música se adequa perfeitamente aos acontecimentos e aqui tanto voltamos a ter tanto as peças mais relaxantes e subtis de Life is Strange, como músicas mais movimentadas e pesadas, por exemplo quando Chloe se encontra numa festa. As vozes por vezes podem não acompanhar a excelente qualidade dos restantes efeitos sonoros, mas nem por isso passam a estar mal ou destoam.

Desta vez Max cede o protagonismo por completo a estas duas personagens.

Uma das preocupações que muitos poderão ter, e que são completamente justificadas, é a seguinte: por onde começar? É necessário jogar Life is Strange antes de Before the Storm? Muitas das prequelas que são lançadas nos diversos meios, seja em livros, filmes ou jogos, requerem que o consumidor já esteja por dentro dos eventos que se passaram no livro/filme/jogo de que a prequela é uma prequela. Com Before the Storm tal não é o caso e qualquer um pode pegar neste jogo e igualmente desfrutar do mesmo. Terão, no entanto, uma experiência diferente, embora não inferior. Quem já tenha percorrido a jornada de Max saberá de muitas das consequências do que está a acontecer em Before the Storm, nomeadamente onde vai parar a relação de Rachel Amber e Chloe, e portanto encontrará nesta prequela mais uma satisfação da curiosidade de saber como se foi construindo esta ligação do que propriamente muito de completamente novo. Por outro lado, quem começar por este jogo irá estar completamente no escuro e portanto tudo será mais inesperado, mas em contrapartida não terá uma ligação anterior às personagens que figuram neste título. Assim, não existe uma ordem certa para entrar nesta série, e até mesmo jogar os dois em simultâneo pode ser uma hipótese. Tudo depende da experiência que procuram.

Opinião Final:

Life is Strange: Before the Storm faz um bom trabalho em manter a mesma estrutura, jogabilidade, qualidade narrativa e de efeitos sonoros, assim como outros aspetos do primeiro, apresentando-nos a vida de Chloe em Arcadia Bay enquanto Max se encontrava em Seattle, antes dos eventos do primeiro Life is Strange. Embora não seja ainda o segundo título da série, pelo qual todos esperam ansiosamente, cumpre mais que bem a sua função de proporcionar uma experiência sólida que ao mesmo tempo consegue manter as virtudes do trabalho da Dontnod. Tem alguns pontos menos bons, mas são facilmente contornáveis. Se gostaram de Life is Strange, irão com certeza gostar de Before the Storm.

Do que gostamos:

  • Estrutura narrativa mantém a qualidade da de Life is Strange;
  • Efeitos sonoros bem trabalhados e contendo uma banda sonora excelente;
  • Boa adaptação das mecânicas do primeiro Life is Strange à personalidade e mundo de Chloe.

Do que não gostamos:

  • Falta de um bom substituto da mecânica de viajar no tempo (que diversificava a experiência no título original);
  • Alguns momentos/situações de interação pouco natural ou forçada entre as personagens.

Nota: 8/10