Daemon X Machina – Análise

Eu sou aquele pássaro que vê coisas brilhantes e quer tê-las. Creio que foi na E3, de 2018, que este DAEMON X MACHINA foi revelado e a minha reacção foi um misto de curiosidade cautelosa com “uau, tenho de jogar!”. Depois, o jogo desapareceu dos radares e esqueci-me dele até ao próximo trailer. Mechas, espadas gigantes, lutas alucinadas e explosões a ofuscar a vista. À partida, já estava a contar que este DAEMON não fosse um jogo para pensar muito, mas para dar aos dedos e causar o máximo de caos possível enquanto se é fixe. Uma espécie de Devil May Cry robótico ou uma Bayonetta com menos sex appeal. Todos os one liners, todo o cliché e o queijo possível e imaginário.

Depois, saiu a primeira demo – uma versão em produção que visava recolher o feedback dos jogadores para melhorar o jogo. E a única coisa positiva que tenho a dizer sobre isto é que mais estúdios deviam seguir o exemplo. A oportunidade de poder contribuir para o desenvolvimento de um jogo é uma honra, mas não quer dizer que tenhamos de ter os dedos em todas as tartes. Há que respeitar as intenções originais do estúdio e consumir o que que lhes vai na cabeça, mas… um produto mau é um produto mau e se ninguém o consumir, quem perde é o artista. Vai daí, a demo levou a um questionário e os fãs fizeram-se ouvir. Meses mais tarde, foi lançado um trailer com o feedback implementado e as diferenças eram notórias. Infelizmente, não gostei da demo e isso era um mau augúrio para o jogo final. As primeiras impressões contam bastante; apanhei detalhes que não gostei e, embora esperasse que fosse só da demo, acabaram por estar no jogo final.

A melhor maneira de aproveitarem o jogo é serem fãs do género, de animes como Gundam, Macross ou Evangelion ou de jogos como Armored Core ou Zone of the Enders. Desta lista, apenas vi Evangelion e adorei. Ainda assim, fui de mente aberta e preparado para as tropes e clichés, e nem foi isso que me desiludiu. Vamos começar pelo enredo porque é ao que dou mais importância.

A premissa é básica: parte da lua foi destruída e colidiu com o planeta. O caos foi massivo e a superfície ficou irreconhecível. A catástrofe levou ao aparecimento de partículas Femto, que corromperam as inteligências artificiais, tornando-as hostis face à humanidade. Esta nova energia Femto também é fatal para humanos, embora dê aos Outer habilidades especiais. Como tal, são os candidatos perfeitos para pilotarem os Arsenal e lutarem contra as AI (Arms of Immortals). Nada de novo no mundo da ficção científica, mas também não esperamos que invente a roda. Até ao final, a história tem umas curvas e contra curvas, mas, honestamente, é das piores coisas a que já tive o prazer de assistir. Primeiro, porque a nossa personagem tem menos personalidade que uma caixa de cartão. Eu não me importo com a trope da personagem silenciosa, porque temos a possibilidade de moldar o jogo, mas se escolhi dois diálogos em DxM, foi muito. Se não existisse, o jogo seria igual. Segundo, o resto do elenco é execrável. Se, em vez dos nomes/nomes de código tivessem um rótulo da personalidade que representam, seria a mesma coisa. Temos o melhor amigo, o rival, o líder, o tipo soturno da realeza (com um mordomo a condizer), as miúdas com personalidade pastilha elástica, os rebeldes, o vilão com discursos, etc. Todos com diálogos péssimos, que se tornam piores pelas vozes em inglês. Tive de mudar para japonês porque o que não entendo não me magoa e assim sempre parecem mais fixes.

Quem são vocês, mesmo?

Assim que criarmos a nossa personagem, vamos para o hangar, onde se passa todo o santo jogo. É aqui que aceitamos as missões, equipamos o nosso Arsenal, comemos gelados que nos aumenta os atributos para as missões, e alteramos o nosso corpo para termos outros atributos. Na teoria, tudo certo. Na prática, é para lá de aborrecido. Há a desculpa de sermos mercenários e aceitarmos missões para ganhar a vida, certo, mas tive flashbacks de outros maus jogos, onde a história era interrompida para voltarmos à hub. Não me senti imerso no mundo porque à vigésima vez que voltava ao hangar, já só queria fugir. E é um espaço tão insosso: tem as armas expostas, o nosso mecha, dois ou três NPC que não interagem, mas que repetem a mesma frase até ao fim, e um cãozito que nos segue. De resto, o jogo procedia da seguinte maneira: aceitar missão → briefing da missão → cutscene para apresentar algumas personagens (quando já estavam todos apresentadas, o jogo trocou estas sequências por caixas de diálogo) → missão curta e repetitiva → hangar. As missões vão desde o Rank E ao A, ou seja cinco capítulos.

Daemon X Machina contém detalhes que, se fossem bem explorados, seriam interessantes, como o facto de haver vários grupos de mercenários. Gostaria de dizer que cada um tinha as suas intenções, mas estes eram a soma das suas personalidades – secos. Cada agente aceitava a mesma missão e numa poderiam ser nossos aliados ou adversários; outro detalhe para apimentar a história que ficou por terra. Às tantas, dei por mim a pensar: quem és? De onde vieste? O que queres? E o jogo tentava fazer com que me preocupasse com discursos épicos, drama e sacrifícios  – e eu sou fácil de ir à lágrima, mas sempre que uma cena destas surgia, não deixava de revirar os olhos ou coçar a cabeça. Sem spoilers: uma personagem sacrificou-se por outra. Levou com os danos, caiu nos braços de quem salvou, debitou o discurso, música dramática e faleceu e eu sentado em silêncio a tentar entender de onde apareceu aquela pessoa. Surpresa das surpresas, na cena seguinte estava tudo normal. Porreiro!

Mas não jogamos estes jogos pela história, podem dizer. Certo, então vamos à jogabilidade. Daemon safa-se neste aspecto. Não é mau, de todo, mas também não é estelar, e esta é a minha opinião pessoal. Não sou pro em jogos de acção. Se pegar num DMC ou num Bayonetta, não saco de combos do ar ou faço piruetas com os inimigos, mas sinto-me bem com o que consigo fazer, sinto-me fixe e confiante e sinto aquela adrenalina de ser a personagem. Aqui não me senti fixe nem um piloto de um mecha. Senti-me frustrado e até entediado. O jogo não é difícil, mas chega a ser chato porque por exemplo há inimigos que são esponjas de balas. E quantas vezes temos de escoltar o mesmo comboio ou destruir os mesmos tanques ou drones? Só os bosses variam um bocado e mesmo assim desiludem – só há dois em todo o jogo que me fizeram inclinar no sofá por serem bons. De resto, lutamos contra os Arsenals, mas a diferença entre estes e um tanque é que demoram mais a morrer…

Não se enganem, lutas destas são raras.

A única maneira de fazer frente a esta monotonia é com a personalização, e esta é incrível! Se tenho de dizer coisas boas acerca de Daemon, esta é a primeira. Podem alterar o vosso Arsenal como bem vos apetecer. Pernas novas, braços, tronco e cabeça. Processadores novos, acessórios extra etc. Há um leque vasto de todo o tipo de armas: snipers, pistolas, metralhadoras, porta mísseis, lasers, escudos e espadas. Podem combinar ou fazer pandã com os mesmos modelos. Podem pintar todas as partes, aplicar padrões ou logos que apanham ou ganham nas missões e deixar o vosso mecha igual ao EVA 01, ou replicar um de outros jogos ou séries. Após derrotar inimigos, podem ganhar esquemas para construírem mais Arsenal, mas o processo não é fácil e requer a repetição do mesmo nível.

Outro ponto positivo: o replay value. Se acabarem por gostar do jogo, terão razões para não o largar. Podem repetir as missões anteriores (Free Missions) com novas variantes e objectivos. A opção para recrutar parceiros fica disponível e, à medida que os desbloqueamos no jogo, podem-vos acompanhar nestas missões – cada um com as suas habilidades próprias. Já quanto ao multijogador, tanto podem jogar com amigos localmente, como pela Internet, em alternativa a jogarem com a IA se não tiverem amigos. Não pude, no entanto, testar o multijogador online, dado que não tinha uma subscrição ativa do Nintendo Switch Online.

Testei o jogo nos dois modos de jogo permitidos pela Switch: portátil e docked. Posso dizer que, se tive uma quebra de framerate em dez ou mais horas de jogo, foi muito. O jogo corre lindamente, os controlos são acessíveis e podemos ajustar a interface à nossa medida, limpando-a para uma experiência mais cinematográfica.

A nível visual, senti alguma incoerência. Se os gráficos dos Arsenal estavam brutais e detalhados, mesmo tendo em conta todas as opções de personalização de armas e efeitos, as personagens humanas estavam estranhas e pareciam saídas dos finais da era PS2. Não estavam maus, mas também não estavam ao nível dos mecha. Talvez por terem menos destaque? Temos ainda os cenários, que são só maus e sinónimo de zero esforço. Além de se repetirem e dos inimigos também sem variedade, não há detalhe, não há personalidade, não há aqui um trabalho de qualidade. Dando o braço a torcer, temos de ter em conta a desolação do mundo de jogo, mas já vi cenários apocalípticos com mais qualidade. Por fim, os pilares que passam por prédios que podem ser destruídos. Há dois mapas que se destacam, um mapa nocturno que realça todas as cores do cenário e personagens, que é belo, e um mapa perto do final que é péssimo, em que nem sabia se estava no ar ou em terra.

O céu é o limite no que toca à personalização do vosso Arsenal.

Última coisinha boa a escrever sobre este jogo: a banda sonora. Com temas de metal, orquestrais e batidas rápidas e alucinantes, todas as faixas conseguem transmitir emoções e uma adrenalina que devia ser acompanhada de cenas épicas e um bom enredo. Infelizmente esta banda sonora, que roça a perfeição, não consegue carregar este jogo sozinha, mas é tão boa que tive de aumentar o volume da música e reduzir o dos diálogos para não ter de os ouvir.

Opinião Final:

Terminei o jogo e termino esta análise com muita pena. Tenho pena de o não ter apreciado como queria e que a minha primeira experiência no género tenha sido tão amarga. Tenho plena consciência de que estes queixumes possam ser só meus, mas é melhor ser honesto do que dizer que é bom e depois ficarem desiludidos. Se gostarem, óptimo! Mostrem que há interesse e talvez lancem mais e melhores. Se o arranjarem a um preço mais em conta, o estoiro também não é muito. Aprecio a dedicação do estúdio Marvelous com a sua demo e recolha de feedback, mas fico à espera de uma próxima aventura. Também não consigo deixar de sentir que a data de lançamento, mesmo no meio de títulos possantes como Astral Chain e Link’s Awakening, acarretam um sentimento de falta de confiança do estúdio. Espero estar enganado e que este seja um título de aprendizagem para a Marvelous.

Do que gostámos:

  • Banda sonora;
  • Personalização dos Arsenal;
  • Replay Value.

Do que não gostámos: 

  • Enredo;
  • Visuais;
  • Repetição de recursos.

Nota: 6/10