Maneater – Análise

Não é novidade, seja na indústria dos videojogos ou na indústria áudio-visual como um todo, que no momento em que algum conteúdo alcança um nível de sucesso e críticas positivas, outros estúdios sentem o cheiro a sangue na água e decidem participar do banquete, desenvolvendo as suas versões no género. Na maior parte das vezes, estas não trazem verdadeiramente nada de novo (o género souls-like talvez seja o exemplo mais evidente disso). Entretanto, por vezes algum estúdio decide arriscar e trazer uma experiência totalmente inesperada aos jogadores, e é isso que a Tripware Interactive se propôs a fazer com Maneater: trazer um jogo de vingança da “mãe-natureza” contra a poluição e exploração irresponsável dos mares pela humanidade, através das barbatanas de um tubarão.

Num primeiro momento, os jogadores casuais podem até pensar que Maneater se encaixa naquela categoria de simuladores aleatórios e exagerados como Goat Simulator, Bread Simulator, Bear Simulator, etc., mas rapidamente vão perceber que o jogo tem muito mais a oferecer e que a sua proposta de ser um RPG de mundo aberto com alguma complexidade, não é de todo um sonho.

A história tem início com o jogador a assumir as barbatanas de um tubarão fêmea da espécie “cabeça-chata” (Carcharhinus leucas). Aqui aprendemos os comandos básicos do jogo, como nadar, alimentar-se, emergir, etc. Mas, no exato momento em que começamos a incluir seres humanos na nossa dieta, atraímos a atenção do grande antagonista do jogo, Scaly Pete, um caçador de tubarões impiedoso que está a participar de um documentário televisivo semelhante ao “Shark Week” do Discovery Channel, mas numa visão oposta à proteção e educação sobre esses animais.

Pete, sem muito esforço, mata o nosso tubarão fêmea, trá-la para o seu barco e tem uma surpresa ao descobrir que esta estava grávida. Mostrando então todo o seu ódio por estes animais, apunhala o pequeno tubarão, com claras intenções de o atirar ao mar para morrer. Contudo, o pequeno “Baby Shark” surpreende o caçador, devorando e arrancando a sua mão, antes de ser arremessado ao mar. É verdadeiramente nesse momento, que tem início a nossa jornada.

Estão preparados para esses caçadores?

A história definitivamente não será o ponto forte do jogo – estará presente durante toda a jornada, com o nosso tubarão a deixar bem claro que tem Scaly Pete como o seu grande alvo, porém não esperem nada de muito complexo. Essencialmente, a história está presente muito mais como uma maneira de pontuar momentos na jornada e até de trazer um momento para que o jogador possa respirar entre tanto sangue. Assim sendo, a história e esta jornada de vingança nunca se tornam irrelevantes, mas também não serão a grande motivação dos jogadores.

Toda a história e a própria ambientação são desenvolvidas de maneira divertida, sem nunca esquecer de deixar pequenas criticas ambientais, uma abordagem que talvez funcione até melhor do que se o estúdio tivesse optado por uma abordagem demasiado séria e realista. Afinal, não podemos esperar toda uma complexidade dramática de um jogo onde assumimos o controlo de um tubarão.

Na verdade, o verdadeiro destaque está na jogabilidade, já que o objetivo é evoluir esse pequeno filhote enquanto ele se alimenta de tudo o que encontrar pela frente, desde a vida marinha ali presente, até colecionáveis e, é claro, humanos. Ao abraçar o género RPG, o estúdio representou essa evolução através de estágios de crescimento com base em nível e idade, com o filhote a chegar à adolescência, fase adulta, transformar-se num ancião e finalmente, a alcançar o estágio de “Mega-Tubarão”.

Mas a evolução não se restringe apenas a nível e idade. À medida que o jogo avança, novas habilidades são desbloqueadas, e o jogo oferece três opções principais que vão literalmente transformar o tubarão na maior ameaça que aquele litoral já viu. A primeira é de que, ao explorar o mapa do jogo dividido em regiões, será possível encontrar e destruir pontos de referência (locais esses que fazem menções a conteúdos de filmes, animações e até mesmo outros videojogos).

Uma clara referência a Pennywise, principal vilão da obra IT

A segunda opção será a de enfrentar e derrotar “Monstros Ápices”, espécies de predadores que já enfrentamos anteriormente, mas que surgem com mais resistência e alguma característica física especial. Estes vão aparecendo à medida que o jogador for avançando na história, concluindo as missões espalhadas pelo mapa.

A terceira e última opção é o “Ranque de Infâmia”, que funciona num sistema semelhante às estrelas da franquia Grand Theft Auto. No caso de Maneater, à medida que o jogador devora humanos, o seu nível de infâmia irá crescer e, quando chegar ao máximo, um caçador famoso naquele mundo vai aparecer para pôr fim ao seu reinado de terror e sangue. Esse medidor nunca se irá reduzir, sendo que a cada caçador derrotado, o próximo será ainda mais difícil e utilizará novas e mais desafiantes estratégias para finalmente matar o tubarão. Haverá até mesmo situações em que o caçador terá uma barreira elétrica ao redor do barco e caberá ao jogador encontrar uma maneira de desligar o gerador e, assim, conseguir atacar o barco e os seus tripulantes.

O mapa do jogo tem um tamanho considerável e é dividido em oito regiões que se encontram interligadas de alguma maneira, sendo que cada uma delas terá o seu próprio ecossistema, com espécies marinhas únicas, sendo possível encontrar desde pequenos peixes na região inicial, até outras espécies de tubarões em áreas mais avançadas do mapa. Além disso, cada espécie oferecerá um nutriente diferente (gordura, proteínas, minerais e o agente mutagénico X) que serão utilizados justamente para aprimorar as habilidades anteriormente citadas.

O mapa está dividido em oito regiões.

Ao apostar em elementos de RPG, Maneater oferece uma longevidade variável, sendo que aqueles que se focarem unicamente nas missões e se dedicarem pouco à evolução do seu tubarão, deverão finalizar o jogo em cerca de 10-12 horas. Mas aqueles mais apaixonados pelas mecânicas de evolução, exploração e combate contra os caçadores, vão facilmente ter em mãos um jogo capaz de ultrapassar as 20 horas de jogo.

Este título inclui ainda legendas em PT-BR, sendo esta uma excelente opção para aqueles que, mesmo considerando este um elemento secundário, querem entender um pouco mais da história do jogo, além dos próprios menus estarem 100% traduzidos. Por outro lado, aqueles que preferirem desfrutar do jogo em inglês, terão a sua disposição a narração da história, sendo feita por Chris Parnell, ator mais conhecido pelas suas participações em Saturday Night Live, além de emprestar a sua voz ao personagem Jerry Smith, em Rick e Morty.

Não há como negar que Maneater é um jogo bastante despretensioso, com mecânicas simples e uma história extremamente acessível e divertida. Tudo isto combinado pode surpreender muitos jogadores na capacidade de os fazer esquecer o mundo ao seu redor e passar horas à frente do ecrã enquanto jogam. Contudo, infelizmente o jogo não está isento de problemas e alguns até bem graves.

Um dos problemas mais irritantes e que vão acompanhar o jogador durante toda a aventura será a própria câmara do jogo, que pessoalmente até não me incomodou tanto durante os momentos de exploração e na hora de emergir. No entanto, chegou a ser frustrante enfrentar alguns inimigos com movimentação rápida, já que incontáveis vezes a câmara não facilitou a tarefa de encontrar e morder os inimigos. Além disso, em momentos onde era necessário saltar no ar para apanhar um dos colecionáveis do jogo, a câmara novamente mostrou-se um vilão pior do que o próprio Scaly Pete, já que insistia em não focar no objeto, o que eventualmente fazia com que o tubarão não fosse na direção pretendida.

Outro problema relativamente frequente e igualmente incomodo foi que durante a minha experiência a jogar na Xbox One (não posso afirmar se o mesmo acontece em outras plataformas) o jogo travou algumas vezes e simplesmente fechou. Felizmente, em nenhuma das vezes em que isso aconteceu, a progressão foi comprometida ou os dados de gravação corrompidos, mas naturalmente representou um grande incómodo e prejudicou a imersão em alguns momentos.

Infelizmente, os jogadores têm à sua disposição apenas 3 variedades de habilidades principais.

Algo que também pode incomodar alguns jogadores é que mesmo oferecendo uma opção para aprimorar as habilidades, o jogo ainda assim não apresenta uma grande variedade de habilidades principais, sendo estas apenas três: Óssea, Elétrica e Sombra. Num jogo de outro género, até seria aceitável, tomando em consideração as 9 opções de “Órgão”, mas num jogo onde o elemento de RPG é tão presente, tal acaba por deixar um sentimento de que o estúdio poderia ter adicionado bem mais. Mas, obviamente que isso pode facilmente ser alterado no futuro, caso a Tripware Interactive, adicione novas habilidades através de atualizações ou DLCs.

Opinião Final:

Maneater é um jogo muito divertido, totalmente despretensioso, repleto de referências a outras obras, com uma história cheia de humor e uma jogabilidade simples, mas extremamente eficaz na hora de entreter e oferecer uma experiência satisfatória àqueles jogadores que procuram algo que os faça sentar algumas horas à frente do ecrã e aliviar o stress do dia-a-dia. Neste jogo não é preciso pensar muito ou sequer investir-se emocionalmente a uma narrativa complexa, apenas devorar tudo o que surgir pela frente e evoluir o tubarão até que ele se torne uma máquina de transformar o oceano numa piscina de sangue.

No entanto, alguns problemas apresentados durante a jornada podem incomodar muito, e, em alguns casos, até comprometer justamente esse objetivo de ser um jogo para relaxar.

Do que gostamos:

  • Jogo extremamente divertido;
  • Apesar de simples, a narrativa serve para pontuar momentos específicos do jogo;
  • Elementos de RPG bem aplicados dentro do universo do jogo;
  • Uma ambientação extremamente viva e diversificada;
  • Diversas menções a filmes, animações e outros jogos com ambientação semelhante;
  • Mecânicas simples e intuitivas;
  • Totalmente traduzido para PT-BR.

Do que não gostamos:

  • Falhas evidentes e incómodas com a câmara do jogo;
  • Algumas missões acabam por se tornar repetitivas;
  • Bloqueios que fazem o jogo fechar;
  • Pouca variedade de habilidades quando comparado à grande maioria dos RPGs;
  • Loading em locais pontuais na transição de mapas;

Nota: 7,5/10

Jogo analisado através de uma cópia da versão Xbox One, gentilmente cedida pela Tripware Interactive.