The Last of Us Parte II – Análise

Uma geração depois, Ellie e Joel voltam a ser cabeça de cartaz para fechar mais um ciclo para a marca PlayStation. Depois de vários anos à espera do sucessor de um dos jogos mais bem sucedidos da história do entretenimento, a expetativa era naturalmente grande. Muito pelo detalhe e primor que a Naughty Dog tinha prometido aos jogadores.

Mais uma vez, o estúdio sentiu a necessidade de se reinventar, de trazer novos elementos e valores à industria. A forma como esta narrativa é contada e a mensagem que passa é um hino ao sentimento, ao drama e aos conflitos que podemos encontrar nos choques em que o bem e o mal simplesmente se desvanecem, deixando apenas, pontos de vista. Esta visão mais filosófica e profunda sobre o mundo de The Last of Us aplica-lhe um nível de complexidade muito superior ao que encontramos no primeiro jogo, que embora seja um enorme feito narrativo pela sua construção e caracterização, tem em si uma historia linear com um enredo relativamente previsível.

The Last of Us Parte II passa-se cinco anos depois da primeira aventura. A Ellie cresceu e e tornou-se numa mulher independente com valores bem assentes marcados pela história do primeiro título, algo que nos é incutido logo à partida de forma muito natural e orgânica. Foi como voltar a ver um amigo ou familiar anos depois, mas reconhecê-lo de forma instantânea, mantendo toda a empatia e cumplicidade criada de forma perpétua em 2013. Assim como a Ellie, foi bom voltar a ver o Joel, uma figura paternal que de tudo fez no primeiro jogo para salvar quem amava, relembrando este bonito poema que foi The Last of Us (1). A premissa do primeiro título foi a de uma história de amor entre um pai e uma jovem  que tudo perderam na vida e viram um no outro a única forma de conseguir amenizar a hostilidade de um mundo pós apocalíptico, cruel e em tudo injusto, onde o mundo retirou algo ao Joel e este retirou algo ao mundo. Quem o jogou saberá certamente ao que me refiro.

Porem, em The Last of Us Parte II, o foco narrativo sofreu uma forte alteração, substituindo o amor por um sentimento de raiva em torno de Ellie, que fez com que esta partisse numa aventura em busca de retaliação. A Ellie que conhecemos continua a ser a mesma, apenas perturbada por acontecimentos na história que despoletaram mudanças vincadas na sua forma de ver o mundo, assim como nos seus objetivos futuros. Todo o desenrolar da narrativa cria sucessivas visões às quais o jogador terá dificuldade para as considerar cruéis ou compreensíveis. E esta foi a aposta da Naughty Dog, revelar um mundo impiedoso, ao mesmo tempo que sublinha de forma constante que todos os personagens são importantes a alguém. É de facto delicioso ver como toda a obra foi construída e fluentemente desenrolada. Se foste vítima de spoilers assim como eu, podes esquecer tudo o que viste, a experiência em si supera qualquer expetativa que possas ter criado em torno dos infelizes leaks.

The Last of Us Parte II é um jogo linear, bem ao estilo do estúdio Norte Americano. Porém, tem uma amplitude e escala brutal, superando facilmente Uncharted 4: O Fim de um Ladrão. Os cenários são imensos, o foco em exploração foi ampliado inúmeras vezes face ao primeiro, fazendo com que percamos horas e horas apenas a apreciar os fantásticos detalhes entregues ao jogo, ao mesmo tempo que vamos sendo recompensados com inúmeros colecionavéis e momentos visuais fantásticos. A implementação do salto deu uma verticalidade muito bem vinda ao jogo. Agora, além de termos espaços mais vastos horizontalmente, podemos ainda ganhar mais espaço dada à sua verticalidade quase sempre presente. Trepar camiões, muros entre outros objetos é uma constante e faz com que rapidamente queiras escalar tudo para ver mais e mais, porque tal como eu, sabes que com a Naughty Dog a surpresa pode estar ao virar da esquina. Além de tudo isto, na minha memória tenho The Last of Us Parte II como o maior jogo linear feito até hoje. Dificilmente terminarás a história com menos de 25 horas de jogo, podendo facilmente chegar às 35 horas. Isto é um feito enorme face ao que estamos habituados em títulos com total foco narrativo, em que predominantemente são jogos mais curtos do que qualquer experiência sand box.

Além de muitas personagens novas, também são muitos os tipos de inimigos que te vão fazer a vida negra. Tal como no primeiro título, vamos encontrar diferentes fações que promovem valores e pontos de vista totalmente distintos uns dos outros, marcando a polivalência de viver num mundo sem lei, em que o instinto pela sobrevivência perdura acima de qualquer outro desejo. A inteligência artificial foi muito melhorada tanto nos inimigos como nos aliados. Agora estar escondido atrás de uma parede ou de um carro só te traz uma segurança momentânea, fazendo com que estejas em constante movimento quando avistado por algum inimigo, pois senão és facilmente flanqueado e morto. Os cães são um elemento que apesar de dar muita pena de chacinar, tem de ser um alvo a abater. O seu faro faz com que estejam constantemente a perseguir-te, obrigando-te ou a esquivar enquanto os tentas distrair ou então matá-los rapidamente para que possas ter mais espaço para delinear a tua estratégia. Entre os inimigos, existe ainda um detalhe impressionante. Quando matas alguém e uma outra pessoa vê, em muitos momentos ela grita e chama por ele num desespero recorrente de sentir a perda de alguém. O mesmo acontece com os cães em relação aos donos e vice versa, é de uma angustia tremenda em diversos momentos.

Com os cenários mais amplos e vários tipos de vegetação, o modo furtivo ganhou uma nova importância. Agora, as opções de stealth disponíveis são muito maiores e também muito mais regulares. A variedade de abordagens construída dá a cada jogador a possibilidade de aplicar o estilo de gameplay que pretende com uma total liberdade, literalmente. Deixando para trás qualquer eventualidade de existir confrontos “scriptados“.

Todo este lado humano que tenho referido desaparece assim que os confrontos passam a ser com infetados. Nesse caso, queremos exterminá-los a todos e da forma mais eficaz possível, para poupar munição e suplementos, mas também para evitar surpresas desagradáveis. Além dos corredores e dos clicadores, existem novos tipos de infetados que vieram para ficar na memória, com caraterísticas únicas que tornam o universo de The Last of Us Parte II ainda mais grandioso. Mas isso, vou deixar de lado para que te possas surpreender durante a tua experiência.

Ao nível do gameplay, o jogo assemelha-se bastante ao primeiro, “apenas” melhorado em todas as vertentes, mantendo o jogo atual e compatível com tudo o que de novo traz. A esquiva é uma das novidades de maior relevo no que à jogabilidade toca, rapidamente te habituas a esquivares-te dos inimigos, dando imenso jeito em momentos de batalhas tensas. De resto, continua a ter uma jogabilidade pesada (embora a Ellie seja bem mais ágil que o Joel), o balanceamento das armas bastante desafiante, o sistema de cura é o mesmo, assim como o modo de construirmos novos materiais e armamento. O sistema de recolha de materiais também se manteve e ao longo do jogo somos sempre convidados a explorar os cenários para encontrar balas, novas armas, e materiais necessários para construção. Os upgrades das armas também se mantém idênticos, podendo ser feitos nas mesas de craft. Cada upgrade para cada uma das armas (incluindo algumas novas) tem uma animação totalmente diferente, mais um momento em que a Naughty Dog dá o ar da sua graça e nos traz detalhes nunca antes vistos. Podemos aplicar vários tipos de improvisação às armas, como: miras óticas, estabilizadores, mais munições, mais cadência entre muitos outros.

Como já era de esperar, o visual do jogo é sublime e entra diretamente para o pódio no que toca a grafismo. Desde das expressões faciais de luxo, em que muitas das vezes apenas pelo olhar conseguimos perceber o sentimento transmitido por determinado personagem, às diferentes paisagens presentes, é em todo o momento, um jogo belíssimo. A par de Red Dead Redemption 2, The Last of Us Parte II é, na minha opinião, o jogo mais bonito da geração, com detalhes impressionantes.

Gustavo Santaolalla contribuiu de forma preponderante para a criação e ambientação de toda a obra. A sua mestria no primeiro jogo teve uma ótima descendência em The Last of Us Parte II, e embora possa não haver músicas tão marcantes como no primeiro título, a banda sonora acompanha cada momento na perfeição, tornando ainda mais imersivo tudo o que de quase perfeito já existe no título.

Apesar de ser um título acessível, a dificuldade comparativamente ao primeiro  parece-me mais elevada. Joguei na dificuldade normal mas mesmo assim foram várias as vezes em que morri. Mesmo com uma maior abundância em itens, também existem muitos mais confrontos e inimigos nesta sequela. Para isso, a Naughty Dog permite aos jogadores personalizar a dificuldade do jogo em todos os sentidos. Podemos baixar a dificuldade nos inimigos, mas aumentar a escassez de materiais por exemplo. São várias as escolhas para uma experiência totalmente personalizada, algo que também registo como inédito na industria.

Opinião Final:

The Last of Us Parte II é tudo o que a Naughty Dog tinha pensado para o título. Um jogo com uma narrativa única, forte e brutal, num mundo impiedoso que se reflete através da violência, ódio e sobrevivência, mas também pela compaixão e esperança. The Last of Us Parte II é em todos os momentos único e especial, levantando valores mais altos. No geral, é uma experiência sem precedentes que o torna obrigatório e num dos videojogos mais bem construídos da história. É pura e simplesmente, uma obra de arte.

Do que gostamos:

  • Narrativa fantástica;
  • Mundo e ambientação;
  • Visuais de tirar o folgo;
  • Múltiplas formas de abordagem;
  • Vários inimigos;
  • Armas e sistema de craft;
  • Inteligência artificial;
  • Ellie.

Do que não gostamos:

  • Falta de modo online.

 

Nota: 10/10