Xenoblade Chronicles: Definitive Edition – Análise

Por vezes, os raios caem duas vezes no mesmo lugar.
Quando em 2013-14 voltei a comprar uma Nintendo Wii, uma amiga recomendou-me jogar o Xenoblade Chronicles por partilharmos gostos dentro do género dos RPG. E recomendar foi um eufemismo porque via-se que ela adorava o jogo enquanto falava da história, das personagens e do resto. Não precisava de ouvir mais, a semente da curiosidade já estava semeada e comprei-o nesse mesmo dia após ver um trailer. O jogo demorou pouco mais de uma semana a chegar e comecei-o logo. Admito que a minha primeira reacção não foi das melhores: o jogo tinha um ar de Playstation 2, os controlos eram toscos e os comandos da Wii não ajudavam, não sabia usar itens ou curar-me e como raio ataco?! Sentia-me triste e algo frustrado por pensar que tinha gasto dinheiro num jogo que não iria gostar…

Avancei mais horas e as peças começaram a encaixar como numa partida de Tetris. Assim que tive a jogada perfeita e o quadro ficou vazio de mimimis da minha parte, estava apaixonado por Xenoblade Chronicles. A história e as personagens desenvolviam-se; as suas motivações eram as minhas e os gráficos já nem me incomodavam. A cada tema novo, a banda sonora absorvia-me naquele mundo fantástico e aterrador. E a jogabilidade? Depois de a minha amiga e o seu companheiro me terem dado umas ensaboadelas, tornou-se mais fácil. Deixei de sentir o atrito para com este sistema novo e deixei-me levar, experimentei personagens novas, explorei mecânicas e sistemas e tornei-me mais paciente – se bem que os controlos da Wii continuavam a ser uma nódoa. Esta mudança de mentalidade permitiu-me saborear melhor a história porque já não me sentia tão frustrado com o resto e isto carregou-me nas sequelas e cá estamos neste remaster da Definitive Edition. Portanto, obrigado por me terem dado a conhecer Xenoblade Chronicles!

Apesar de ter gostado (muito) das sequelas, nenhuma conseguiu fazer-me sentir como me senti enquanto jogava este Xenoblade. Os enredos eram bons, os gráficos melhores e o combate mais refinado, mas faltava-lhes algo: a essência e a inocência de ser o meu primeiro jogo da série. Quando comecei este, a abertura era literalmente fora deste mundo: dois enormes titãs digladiavam. Os seus nomes eram Bionis e Mechonis e quando a batalha terminou, dos corpos inertes destes gigantes brotou fauna e flora – vida. Mas as memórias e o ódio perduraram, e a guerra continuou com os Mechon a atacarem colónias de Homs, cuja única esperança reside na Monado, a única arma capaz de fazer frente ao inimigo mecânico e que encerra vários segredos.

Sintam o poder da Mou-ná-dou!

É numa destas colónias que vamos encontrar Shulk, Reyn e Fiora, amigos de infância, a braços com mais um ataque. Desesperado e com aquele típico desejo de personagem de RPG para proteger os seus amigos, Shulk empunha a Monado e não só ampara os golpes da invasão como tem a primeira amostra do poder da Monado: consegue espreitar para o futuro, revelando-lhe, e ao jogador, toda uma premonição do que está para vir. E o mais interessante, é que ver o futuro não é só uma gimmick do jogo, uma vez que esta habilidade está bem presente no sistema de combate. Quando o pó assentou, Shulk embarcou numa viagem de vingança e para impedir que os ataques jamais aconteçam. A ele junta-se um leque de personagens carismáticas com as suas próprias motivações e o percurso do início ao fim do jogo é das melhores coisas que já tive o prazer de assistir: se começa por ser uma típica vingança do herói contra o vilão, quando começarem as revelações, as curvas e as contracurvas já será tarde demais porque já estamos rendidos.

Tetsuya Takahashi não faz as coisas pela metade e cada set piece podia bem ser o final do jogo. Por várias vezes senti o coração a querer saltar do peito, as lágrimas a rodearem os olhos com o que estava a ver e a ouvir. A escolha da música ideal para o momento dramático, aquela revelação bombástica e toda a angústia das personagens que a dobragem inglesa transmite na perfeição deixa-nos na ponta do sofá e depois… avançamos para o próximo capítulo porque há mais, mas muito mais! Xenoblade é um jogo feito por vários mais que contribuem para uma experiência quase perfeita. E para equilibrar a adrenalina, os momentos Heart-to-Heart/Quiet Times vêm abrandar o jogo para desenvolver os nossos parceiros, estabelecendo relações com o jogador e entre si, melhorando a dinâmica do grupo que acabará por influenciar os seus desempenhos em combate.

Sim, sim, a história é muito boa, mas e o resto? Como é que esta Definitive Edition se porta face ao original? Muito bem, obrigado por perguntarem! Mas agora a sério: este Xenoblade parece mesmo outro jogo, um exemplo no que toca esta moda de remasters. Se critiquei que os gráficos originais pareciam saídos da Playstation 2, a minha nova reacção foi de uau; era como se estivesse a jogar um Xenoblade completamente novo!
A Monolith Soft tem vindo a refinar o seu motor em cada sequela e depois de uma expansão ao Xenoblade Chronicles 2, onde os gráficos e o desempenho foram melhorados, seria de esperar um tratamento semelhante e isso viu-se logo no primeiro teaser. As personagens já não pareciam deslavadas ou assustadoras, com expressões faciais de espectros, mas reais, detalhadas e expressivas; o mundo que já era belo e imersivo ganhou uma nova vida e agora vale mesmo parar para admirá-lo numa altura em que ainda não podemos passear à vontade – olhem para o horizonte, para os enormes titãs adormecidos e verão os braços erguidos nas suas últimas posições, cabeças a emergirem das nuvens e vastos oceanos, bosques e vales. Somos tão minúsculos naquele mundo. E as cores! E tenho mesmo de mencionar as cores porque quando mudava do modo portátil para a televisão, pareciam explodir do ecrã para a sala durante as muitas cutscenes épicas que estão agora melhores do que nunca. Mas nem tudo é bom, certo? Se há partes boas, também há as outras… menos boas como a baixa resolução e o detalhe das roupas e cenários em segundo plano, pequenas gotas num oceano. Em modo portátil, o jogo está um pouco desfocado, mas são sacrifícios para que este Xenoblade possa existir hoje. Afinal, a equipa estava e está dividida em vários projectos: este remaster, um jogo novo a anunciar e a sequela do Breath of the Wild e, mesmo assim, é de louvar o empenho e o amor à camisola.

A banda sonora também levou um upgrade com temas remasterizados para acompanharem os novos visuais, mas se preferirem as versões originais, é só alterar nas Definições. Os trabalhos de Shimomura, Kiyota, ACE+ e dos restantes colaboradores continuam imaculadas e apesar de ouvirem várias vezes o mesmo tema nos momentos fulcrais da história, se forem como eu, vão ficar arrepiados com aquele coro. O jogo inclui as dobragens inglesas e japonesas, mas deixem-me escrever que é um pecado jogarem com outras vozes que não as inglesas. A minha primeira vez foi em inglês e quis jogar agora em japonês, mas não fui bem sucedido. Eu precisava daqueles sotaques britânicos a dizerem mou-ná-dou, da voz pomposa do Dunban e das tiradas do Reyn porque ainda estou à espera de outro jogo com melhores deixas durante as batalhas, you can’t have a rainbow without Reyn, baby! E ouvir o Adam Howden a gritar como Shulk é de apertar o coração. Agora, era bom que as bocas estivessem sincronizadas com os diálogos…

Já vimos e ouvimos muito de Xenoblade Chronicles, mas vamos à jogabilidade que estranha, mas que depois se entranha. Queixei-me muito no original porque não podia fazer isto ou aquilo, não podia usar itens nem curar e ficava a vê-los a atacar automaticamente. Sentia-me bastante passivo a olhar para o ecrã até aprender a jogar novamente; o jogo não se joga sozinho apesar das aparências iniciais, requer uma gestão constante da nossa parte desde a posição no campo de batalha ao uso de habilidades. Por vezes é necessário socorrer algum companheiro ou encorajá-lo para continuar a atacar ou ser ele a dar-nos a mão.
Com personagens bem diferentes, temos alguma liberdade para moldarmos a nossa maneira de jogar, começando pela escolha da equipa e de quem controlamos, equipamento e cristais que conferem diversos atributos. As habilidades que decidimos aprender e passar aos companheiros moldam-nos as estratégias e as Arts em que decidimos investir solidificam o nosso estilo de jogo. Atacar tudo o que mexe parece ser a solução mais básica para avançar, mas aqui pode ser a receita para o desastre se não estivermos preparados. Em alternativa, se estivermos muito bem preparados, podemos derrotar inimigos com bastantes níveis acima de nós. Esta Definitive Edition introduziu algumas melhorias ao sistema de combate como notificações subtis que surgem na melhor altura para activar uma Art.

Passo a explicar: em vez de usarem habilidades ao desbarato a pensar que vão tirar mais dano, aguardem pela notificação. Se uma habilidade for mais eficaz nas costas do adversário, coloquem-se por trás e usem-na; se outra habilidade reduz as defesas quando usada de lado, posicionem-se de lado e aguardem pelo “!”. E isto é bastante útil durante o caos da batalha quando não distinguimos cabeças de traseiras e queremos despachar o bicho. E mais uma vez, vem reforçar a importância da estratégia e do posicionamento das personagens; ou porque convém ter alguém a atrair a atenção do inimigo enquanto o flanqueamos. E uma vez que a Monado também permite ver o futuro em combate, irão ter visões aleatórias de ataques devastadores que poderão arrumar com um parceiro. Nessa altura, poderão avisá-lo, ou ao Shulk, para escolherem a defesa adequada ao ataque ou distrair o inimigo.
E quando conseguirem as três barras, poderão activar um ataque especial que não só carrega as Arts já usadas como permite atacar em cadeia, limpando o campo de batalha. Isto e muito mais, à distância de um menu se precisarem de consultar guias.

Se a história é fenomenal e se o combate é divertido, não queria mesmo ser a nódoa no pano, mas alguém terá de o ser: para além dos gráficos que ficaram por trabalhar, deparei-me com algumas dificuldades na mira. Mesmo com os inimigos à frente, o jogo decidia fazer lock-on aos que estavam longe, atraindo uma atenção desnecessária ou um Game Over prematuro. Também tem um problema de ritmo: os vastos e belos cenários que percorremos na nossa aventura, para além das criaturas que se metem no nosso caminho, estão pejados de fetch quests, missões secundárias quase infinitas para encher artificialmente o mundo. Se a expansão do Xenoblade 2 era criminosa porque só podíamos avançar na história se terminássemos um número considerável de fetch quests, aqui estamos melhor. E para evitar qualquer sensação de tédio, aconselho a aceitarem as missões para irem fazendo à medida que avançam pelos capítulos. Se estiverem perto do objectivo, óptimo. Se não, aproveitam apenas o melhor do jogo; ou cumpram estas missões se precisarem de dinheiro ou de uns níveis extra se estiverem com dificuldades em avançar! E como vão esbarrar em algumas partes, terão dois novos modos de dificuldade: um casual para desfrutarem da história e outro mais avançado para um desafio adicional, onde poderão reduzir os níveis das personagens. Mais? E um modo de Time Attack para testarem as vossas capacidades?

Não chega? E uma expansão de nome Future Connected que decorre um ano depois da aventura principal? Com um Shulk e Melia e uma equipa composta por muitos Nopon. Se não gostarem das criaturas redondas e com problemas de fala, vão dar-se muito mal nesta expansão…, mas tirando isso e as vozes amadurecidas dos actores ingleses, a expansão não só inclui novas faixas musicais, alterações ao combate como levanta o véu do futuro da série Xenoblade. Podem começar o jogo pelo Future Connected ou pelo jogo principal. Aqui é tudo à vontade do jogador e com conquistas, recordes e registos de itens obtidos, há muitas razões para voltarmos.

Opinião Final:

Divertido, caótico, emocionante e eterno. Enquanto ouço a banda sonora e escrevo estas palavras, fico com a sensação de que deixei muito por dizer e acredito que um jogo desta magnitude precise de muitas palavras para lhe fazer jus. É raro repetir jogos grandes, mas se tivesse de recomeçar Xenoblade, faria-o com todo o gosto. Não só a história e as personagens são uma boa desculpa para voltar àquele universo criado pela equipa de Takahashi como é divertido que se farta! Se a Buster Sword e a Master Sword já são ícones da cultura popular, vejo a Monado a juntar-se a este panteão sem qualquer dificuldade e com várias sequelas, ports e participações em Super Smash Bros, Xenoblade Chronicles tem um futuro risonho pela frente. E se estivéssemos em modo de discos pedidos, posso ter uma Definitive Edition do Xenoblade Chronicles X?

Do que gostamos:

  • História;
  • Visuais e banda sonora actualizada;
  • Melhorias à jogabilidade;
  • Conteúdo adicional para fãs e novos jogadores.

Do que não gostamos:

  • Existem alguns aspectos que podiam ter sido melhorados.

Nota: 10/10